====== "Melancolia" de Dürer, segundo Panofsky (3) ====== (Panofsky2019) Em um aspecto, porém, o retrato de Dürer difere fundamentalmente dos mencionados anteriormente. A mão, que geralmente repousa suave e frouxamente no rosto, aparece aqui como um **punho cerrado**. Mas mesmo esse motivo, aparentemente original, não foi tanto uma invenção de Dürer quanto uma expressão artística sua, pois o punho cerrado sempre foi considerado: * Um sinal da **avareza típica** do temperamento melancólico, * Um **sintoma médico** específico de certas ilusões melancólicas. Nesse sentido, o punho cerrado não era completamente estranho aos retratos medievais do melancólico. No entanto, a comparação com ilustrações médicas desse tipo apenas enfatiza que **semelhança de motivo** e **semelhança de significado** são coisas muito diferentes. O que Dürer quis (e conseguiu) expressar com esse punho cerrado tem pouco em comum com seu significado nos manuais de cauterização — exceto pela nuance sutil de representar uma **tensão espasmódica**. Aqui, porém, nosso objetivo não é descrever como Dürer reinterpretou a tradição, mas apenas listar os elementos que ele encontrou nela e julgou dignos de incorporar em sua obra. Um último motivo, talvez ainda mais importante para o **significado emocional** da gravura, merece menção — não por seu significado inovador, mas por sua origem tradicional: **O rosto sombreado**, do qual a Melancolia emerge com um olhar quase fantasmagórico. Vale lembrar que esse **"rosto negro"** era um traço muito mais citado na tradição do que o punho cerrado. Tanto o filho de Saturno quanto o melancólico (seja por doença ou temperamento) eram descritos pelos antigos como **escuros e de rosto negro** — noção tão comum na literatura médica medieval quanto nos escritos astrológicos sobre planetas e nos tratados populares sobre os quatro humores. Expressões como: * //"Facies nigra propter melancholiam"//, * //"Nigri"//, * //"Cor da lama"//, * //"Corpus niger sicut lutum"//, * //"Luteique coloris"// poderiam ter sido lidas por Dürer nos textos tradicionais, como por muitos antes dele. Mas, assim como com o punho cerrado, ele foi o primeiro a perceber que o que ali era descrito como **característica temperamental** ou **sintoma patológico** poderia, nas mãos de um artista, ser transformado em: * **Expressão de uma emoção**, * **Transmissão de um estado de alma**.