====== Ratié (IRSA:643-644) – Dilema do Um e do Múltiplo ====== Dizer que tudo, sem exceção, não passa de aspectos diversos assumidos pelo Si Mesmo, não constitui apenas um problema do ponto de vista da existência do outro. Pois a existência mundana em sua totalidade é tecida de diferenças (bheda): o vyavahāra se apresenta como uma vasta rede de distinções e particularidades que, ao se combinarem e se oporem, formam o que chamamos de mundo – o conjunto de objetos e sujeitos diferenciados (bhinna). Ora, afirmar que os diferentes objetos, assim como os diferentes sujeitos, não são em última instância senão formas do Si Mesmo, não é negar toda realidade à diferença ao dissolvê-la em uma identidade universal? Se os objetos e sujeitos do mundo não são senão manifestações múltiplas e variadas de uma consciência una e idêntica a si mesma, que estatuto ontológico se pode atribuir às diferenças que os separam, além daquele de um puro e simples nada? Não é fácil, à primeira vista, compreender que estatuto ontológico a Pratyabhijñā pretende atribuir à diferença. Por um lado, de fato, Utpaladeva e Abhinavagupta não cessam de reiterar, contra os externalismos budistas e brahmânicos, que nada existe fora de uma consciência una (eka), e que em última instância, só é real a não-dualidade (advaya) ou a não-diferença (abheda) das entidades que são distintas dessa consciência única apenas em aparência. Por outro lado, no entanto, afirmam que a diferença não é um simples erro (bhrānti) que a consciência da identidade viria corrigir ao contradizê-la: não é verdade, proclamam contra o Advaita Vedānta, que só a identidade seja real, enquanto a diferença seria pura ilusão. A Pratyabhijñā se esforça assim por navegar entre dois escolhos: o da fragmentação da unidade e da identidade fundamentais do Si Mesmo se a diferença que caracteriza os fenômenos é real, e o de sua esclerose em uma imutável adequação a si mesma da qual todo dinamismo estaria excluído se essa diferença é ilusória. Como pretende resolver a ambiguidade ontológica fundamental à qual parece assim entregar a diferença? Em outros termos: em que sentido e em que medida se pode dizer que a diferença é ilusória segundo Utpaladeva e Abhinavagupta?