DDAG

Como dissemos, o Si não pode ser objetificado, ou seja, conhecido no modo do “aquilo”, como um vaso. Mas então, devemos nos calar? Primeiramente, Abhinavagupta não perde uma oportunidade de lembrar que é impossível não reificar o Si, ao mesmo tempo em que mostra que Utpaladeva faz de tudo para evitar isso:

“Esta (liberdade absoluta do Senhor) constitui precisamente a natureza da consciência. Mas se (o autor) tivesse usado o termo 'consciência'? Dizemos que, então, não seria a consciência a verdade final, pois (essa consciência) seria criada, estando em contato com a objetividade, na medida em que é objeto de uma representação discursiva (do tipo 'eis a consciência'). Da mesma mesma forma, a proposição 'O Grande Senhor, onisciente, onipotente' faria aparecer essa mesma espécie (de objetificação do Si). Sendo assim, deve-se esforçar para evitar, o máximo possível, esse defeito que consiste em denegrir (o Senhor), rebaixando-o ao plano da objetividade. É por isso que (o Senhor) foi indicado (no verso de Utpaladeva) por meio de um locativo absoluto. Pois, enquanto durar o ensinamento (do reconhecimento), é impossível evitar totalmente objetificá-lo” (IPV I, p. 54).

A linguagem, de fato, nos constrange a falar do Si e do Senhor no modo do “aquilo”. É, de fato, impossível indicá-lo, apontá-lo no modo da perfeita subjetividade que, no entanto, lhe é própria. ] Em outras palavras, mesmo que o Senhor não possa ser objeto de uma demonstração — nem para estabelecer sua existência, nem para refutá-la —, devemos admitir que agimos “como se” o Si fosse, de alguma forma, um objeto para nosso entendimento. Abhinavagupta nos pede para dar crédito ao Reconhecimento dessa contradição, com a promessa implícita de que, se aceitarmos essa condição, então tudo se elucidará ao final do “ensinamento”.