bakhtiar:moises-encontra-khidr-3

Moisés encontra Khidr (3)

Bakhtiar, 2019

A Parte 1 contém o comentário sobre o conhecimento do “mar doce” da razão — o processo cognitivo usado por Moisés em seu encontro com “alguém mais sábio que ele”. Este comentário é de Sayyid Qutb em “À Sombra do Alcorão”.

A inclusão deste comentário de Sayyid Qutb (m. 1966) deve-se a suas visões conservadoras que interpretam os versículos corânicos literalmente através de uma abordagem estritamente exotérica. Se entendermos apenas através da razão, como faz Qutb, enfrentamos distorções como a de que justificaria “crimes de honra”.

Alguns indivíduos equivocados distorceram o assassinato de um jovem por Khidr para alegar que sanciona “crimes de honra”, interpretando erroneamente que “um pai pode matar seu filho” sem punição sob a Lei Islâmica.

Além disso, Maulana Maududi aponta outros problemas ao interpretar esta narrativa apenas pela razão: “Dois dos três atos de Khidr claramente violam mandamentos divinos vigentes desde a criação. Nenhuma lei permite danificar propriedade alheia ou matar inocentes. Mesmo com inspiração divina, nenhuma lei torna lícito tais atos.” Se Khidr agiu por ordem divina, a questão permanece sobre a natureza deste comando, pois contradiz princípios corânicos fundamentais. Portanto, tais ordens devem pertencer aos decretos divinos como a recuperação de um doente ou a ruína de outro — aplicáveis a anjos ou criaturas não sujeitas à lei humana, não a seres humanos que devem sempre obedecer aos mandamentos divinos.

Estudiosos do direito divino e líderes sufistas como Ibn Arabi, Al-Ghazali e Abdul-Qadir Jilani concordam que nem mesmo um sufi pode agir contra a lei divina baseado em inspiração pessoal.

Concluímos que Khidr deve ser um anjo ou criatura isenta da lei humana, pois o Alcorão não afirma explicitamente sua humanidade, usando o termo “servo” (que pode incluir não-humanos) e “rajul” (que também se aplica a jinns). Tradições autênticas não confirmam sua humanidade, e seres espirituais frequentemente assumem forma humana (como o anjo que visitou Maria).

A Parte 2 apresenta um comentário sobre o significado interior desta história e sua aplicação ao caminho espiritual — o “espírito da Lei” que resolve as dúvidas criadas pela razão.

Baseado no comentário de Kashani (m. 1329), discípulo de Ibn Arabi, fica claro que esta história é uma anagogia — interpretação que vai além dos sentidos literal, alegórico e moral, alcançando um quarto sentido espiritual ou místico.

Trata-se do conhecimento simbolizado pelo “mar salgado” da intuição — o processo cognitivo usado por “alguém mais sábio” que Moisés.

A Parte 3 oferece uma análise da Psicologia Corânica, mais próxima de Kashani que de Qutb, explicando a jornada interior para alcançar o conhecimento experiencial intuitivo (ma'rifat/irfan/gnose).

Assim, os Mensageiros-Profetas devem nos ensinar inclusive os significados exteriores e interiores das coisas. Talvez Deus tenha enviado Khidr em visão a Moisés justamente para ensiná-lo sobre o conhecimento intuitivo direto da Presença Divina, preparando-o para o profetado.

Embora a consciência (simbolizada por Moisés) continue usando a razão durante o encontro com 'ilm laduni, ela é guiada a conhecer o “significado” interior — sendo o “significado” o espírito da forma. Como mostra a Psicologia Corânica, ele toma consciência deste conhecimento através da purificação do coração (kashf).

Esta narrativa/anagogia revelada ao Profeta Muhammad (que a paz e misericórdia de Deus estejam com ele) visa nos ensinar o que não sabemos — tanto as formas exteriores quanto suas realidades interiores.

/home/mccastro/public_html/speculum/data/pages/bakhtiar/moises-encontra-khidr-3.txt · Last modified: by 127.0.0.1