Corbin (HL:12-14) – Geografia sagrada
A organização, o plano, de toda essa rede depende, desde tempos que transbordam a memória do homem, de um ponto único: o ponto de orientação, o norte celeste, a estrela polar. Basta então dizer que a espacialização desenvolvida horizontalmente para os quatro pontos cardeais se completa pela dimensão vertical de baixo para cima, do nadir ao zênite? Ou não haveria diferentes modos de percepção dessa mesma dimensão vertical, tão diferentes entre si que modificam a orientação da presença humana não só no espaço mas no tempo? Orientação no tempo: as diferentes maneiras como o homem experimenta sua presença na terra, e a continuidade dessa presença em algo como uma história, e a questão de saber se esta tem um sentido, mas então que sentido? Isso equivale a perguntar se a percepção do polo celeste, da dimensão vertical tendendo ao norte cósmico, é um fenômeno uniforme, fisiologicamente regulado por leis constantes, ou se o fenômeno não é regulado e diversificado pelo próprio modo da presença humana que se orienta? Daí então a importância primordial do norte e do conceito de norte: é de acordo com a maneira como o homem experimenta interiormente a dimensão “vertical” de sua presença que as dimensões horizontais ganham sentido.
Ora, um dos leitmotive da literatura do sufismo iraniano é a “Busca do Oriente”, mas essa Busca é a de um Oriente do qual somos avisados, ou do qual compreendemos de imediato, que não está nem situado nem situável em nossos mapas geográficos. Esse Oriente não está compreendido em nenhum dos sete climas (os keshvar); ele é, de fato, o oitavo clima. E a direção na qual esse “oitavo clima” requer que o busquemos não é na horizontal mas na vertical. Esse Oriente místico suprassensível, lugar da Origem e do Retorno, objeto da Busca eterna, está no polo celeste; ele é o Polo, um extremo-norte, tão extremo que é o limiar da dimensão “além”. É por isso que ele só se revela a um modo determinado de presença no mundo, e só pode se revelar por esse modo de presença. Há outros aos quais ele jamais se revelará. Esse modo de presença é precisamente aquele que caracteriza o modo de ser do sufi, mas em sua pessoa também o de toda a família espiritual à qual o sufismo, e nomeadamente o sufismo iraniano, se liga. O Oriente que o místico busca, Oriente não situável em nossos mapas, está na direção do norte, além do norte. Desse norte cósmico escolhido como ponto de orientação, somente uma marcha ascensional pode aproximar.
Uma primeira consequência que se vislumbra é, na verdade, uma desarticulação dos contrastes que regem as classificações da geografia e da antropologia exotéricas, isto é, permanecendo nas aparências. Orientais e ocidentais, nórdicos e homens do sul, não serão mais identificáveis segundo os caracteres que lhes eram atribuídos; não serão mais situáveis relativamente às coordenadas habituais. Resta perguntar em que momento se produz para o homem do Ocidente a perda da dimensão individual irredutível às classificações fundadas unicamente no sentido geográfico exotérico. Então pode acontecer que, da mesma forma que aprendemos a compreender a alquimia como significando algo completamente diferente de um capítulo da história ou da pré-história das ciências, a cosmologia geocêntrica nos revele também seu verdadeiro sentido, um sentido que, também ele, não pertence à história de nossas ciências. Talvez em razão da percepção do mundo, do sentimento do universo sobre o qual repousa, convém meditar e apreciar o geocentrismo essencialmente à maneira da construção de um mandala.
É esse mandala que convém então meditar para reencontrar a dimensão do norte em sua potência simbólica, potência tal que abre o limiar do além. É esse norte que foi “perdido”, quando por uma revolução da presença humana, revolução do modo dessa presença no mundo, a Terra se encontrou “perdida no céu”. “Perder o norte”: não poder mais distinguir entre o céu e o inferno, o anjo e o demônio, a luz e a sombra, a inconsciência e a transconsciência. Presença sem dimensão vertical, reduzida a buscar o sentido de uma história impondo com autoridade os termos de referência, impotente para apreender as formas no sentido da altura, para renovar o impulso imóvel dos arcos ogivais, mas especialista em superpor absurdos paralelepípedos. E o Ocidental se espanta diante da espiritualidade islâmica fascinada pela rememoração do “pacto preeterno” e pela assunção celeste (mi’râj) do Profeta; nem sequer suspeita que, em contrapartida, sua obsessão pelo histórico, sua materialização dos “eventos no Céu”, possa provocar outros espantos. Da mesma forma, os “Céus de Luz” de que fala o sufismo, permanecerão para sempre inacessíveis às ambições da “astronautica”, sem que esta sequer os pressinta. “Se aqueles que guiam dizem: Eis que o Reino está no céu! — então os pássaros do céu antecederão… Mas o Reino está dentro de e está fora de” (L’Evangile selon Thomas, texto copta estabelecido e traduzido por A. Guillaumont, H.-C. Puech… Paris, 1959, log. 3, p. 3, 19-26.).
