Kingsley (Catafalque:331-332) – revelação e profecia
Além de tudo, porém, sua (de Jung) preocupação central não era criar e depois promover mais uma teoria científica. Em vez disso, era fazer com que as pessoas saíssem de sua complacência mental para uma experiência direta da plenitude — o pleroma gnóstico — que está na raiz de nosso ser. Essa experiência primordial, como ele explicou apaixonadamente àqueles que estavam dispostos a ouvir, foi a origem de sua ideia. E é para lá que ela deveria levar novamente.
Portanto, tudo volta ao que está por trás de sua ciência; o que se esconde sob. Em outras palavras, não há a menor chance de entender o que Jung realmente quer dizer quando fala sobre seu diletantismo científico sem relacioná-lo diretamente com o que ele chama de sua “Uroffenbarung”: a “revelação primordial”, tão esmagadoramente real, poderosa e viva, que estava fluindo dentro dele no âmago de todo seu ser.
Não há nada de acidental em sua escolha de uma expressão tão marcante. “Uroffenbarung” é uma palavra que já vinha sendo usada na língua alemã há anos para descrever a existência de revelação divina direta fora do cristianismo, ou antes do cristianismo — um tipo de revelação aberta e acessível aos profetas em qualquer lugar, em todos os lugares, desde o início dos tempos.
É claro que qualquer pessoa pode falar sobre essa revelação primordial como uma questão de teoria. Mas o acesso real a essa realidade atemporal pertence somente aos profetas, enquanto os únicos vestígios dela, como experiência direta, podem ser encontrados na vida dos profetas. E graças às marcas que ele deixou em seus livros, ainda podemos ver o quanto Jung associou essa noção de revelação primordial, bem como a própria palavra “Uroffenbarung”, a uma linhagem profética em particular.
Essa era a linhagem dos gnósticos — e especialmente do profeta Mani. 1)
Mais uma vez, tudo se encaixa perfeitamente em todos os níveis possíveis. Jung não apenas se via, interiormente, como um profeta. Ele também foi capaz de situar esse papel profético em uma perspectiva muito mais ampla, não apenas espiritualmente, mas também historicamente.
E há também a coerência, igualmente perfeita, do quadro que emerge das entrevistas tardias que ele deu — devidamente anotadas e registradas, dia após dia, por sua dedicada secretária — durante o proverbial inverno de sua vida.
Cada palavra e expressão usada por Jung, no final de 1957, tem seu lugar, função e lógica apropriados. O acesso único que lhe foi dado à revelação primordial, à “Uroffenbarung”, é o fator crucial que inevitavelmente lhe impôs sua “Botschaft”: sua missão profética e mensagem ao mundo que já havia sido anunciada desde a primeira frase de seu livro Vermelho.
Ou, para reformular isso em termos um pouco mais humanos, ele foi incapaz de dominar, gerenciar ou lidar com o poder selvagem dessa “Uroffenbarung” — que ele acabou tendo que envolver com o manto da ciência — exatamente da mesma forma e exatamente pelas mesmas razões que ele foi incapaz de tolerar a mensagem profética bruta que lhe foi entregue e que ele acabou tendo que traduzir para a linguagem da ciência.
