Hermes-Tchan O tempo é precioso, veneráveis, mas vocês só pensam em aprender o Ch'an ou o Tao (a meditação ou o caminho) dos outros. Vocês correm por aí agitados como as ondas do mar, levando a sério o que não passa de palavras e frases, buscando o Buda, buscando os patriarcas, buscando mestres. Não se enganem, adeptos! Vocês têm um pai e uma mãe, e isso é tudo. O que mais estão procurando? Olhem para dentro de si mesmos. Não façam como Yajna-datta, aquele personagem que imaginou ter perdido a cabeça e saiu correndo atrás dela. Tudo o que precisam, veneráveis, é se comportar da maneira mais comum possível. Nada de tantas afetações! (A. 36-38; Y. 52). “Vocês só têm um pai e uma mãe”, isto é, vocês nasceram de uma vez por todas, são homens como os outros, existem tal como são, e não há escapatória possível, nem mesmo desejável, pois é neste homem aqui e em nenhum outro lugar que se escondem a verdade e a salvação. Basta redescobri-las em si mesmos. Vocês mesmos são o Buda. Por que procurá-lo lá fora? Por que torná-lo objeto de devoção, um salvador? Lin-tsi volta frequentemente a essa ideia (A. 60-62; Y. 94-99): Vocês não nasceram de suas mães? Ao buscarem o Buda, serão capturados por esse Mâra que é o Buda. (Ou seja, ao buscarem Deus fora de si mesmos, cairão sob o domínio do Maligno; Deus se tornará Diabo para vocês). Ao buscarem os patriarcas, serão acorrentados por esses Mâra que são os patriarcas. Toda busca é penosa. Melhor não ter complicações! Há certos monges raspados que dizem aos aprendizes: “O Buda é a realização suprema. Só se pode cumprir o Caminho (isto é, tornar-se um Buda) amadurecendo o fruto de todas as práticas que devem ser cultivadas por longo tempo.” Adeptos, se fosse verdade que o Buda é a realização suprema (ou seja, um ser transcendente), por que aos oitenta anos, tendo chegado sob a árvore dupla da cidade de Kuçinagara, o Buda morreu ali deitado de lado? Onde está ele agora, o Buda? É claro que, no que diz respeito a nascer e morrer, ele não era diferente de vocês… Vocês ainda dizem que o Buda possuía poderes miraculosos, e que isso é transcendente. Mas todos os deuses celestes, os gênios e os imortais taoístas, os titãs e os demônios da mitologia indiana também possuíam esses poderes: são eles, por isso, Budas?… O verdadeiro milagre não é voar pelos ares ou caminhar sobre as águas: é caminhar sobre a terra.