Huxley Dois

Aldous Huxley — A FILOSOFIA PERENE

VEJA: ORIGINAL
Dois — Divisão
Esta penetração na natureza das coisas e na origem do bem e do mal não é atribuída exclusivamente ao santo, mas reconhecida, obscuramente, por qualquer ser humano, estando demonstrada na própria estrutura de nossa linguagem. A linguagem, como há muito tempo observou Richard Trench, é inúmeras vezes “muito mais sábia, não simplesmente a linguagem vulgar, mas até a do mais sábio daqueles que a falam. Algumas vezes ela capta verdades que antes eram bem conhecidas, mas que foram esquecidas. Em outros casos mantém os germes das verdades que, embora nunca plenamente discernidas, o gênio dos que as vislumbraram capturou num feliz momento de intuição.” Por exemplo, é tão importante que, nas línguas indo-europeias, como observou Darmsteter, o significado da raiz “dois” indicaria maldade. O prefixo grego dys (como em dispepsia) e o latino dis (como em desonrado) são ambos derivados de duo. O cognativo bis dá um sentido pejorativo às palavras do francês moderno tal como bévue (“engano”, literalmente “visão dupla”). Traços daquele “segundo que te conduz à deriva” podem ser encontrados na palavra “dúbio”, “dúvida” e Zweifel — pois duvidar é ter a mente dividida. Bunyan tem o seu “Sr. Olha-Para-os-Lados”, e a gíria americana, seu two-timers. Obscura e inconscientemente sábia, nossa linguagem confirma as descobertas dos místicos e proclama a maldade essencial da divisão — uma palavra, incidentalmente, na qual nosso velho inimigo “dois” faz outra aparição decisiva.



Aldous Huxley