Os olhos corporais como outros órgãos dos sentidos estão em sintonia com um mundo físico, co-respondem a este nível de mundo, constituindo sobre ele a camada de um mundo sensível, considerado pela antiga filosofia grega, segundo o termo aisthesis. Sobre este mundo sensível constitui-se, por sua vez, um mundo perceptível, considerado pelos gregos segundo o termo empeiria. Nestes canais (sensoriais, sensíveis e perceptíveis) de duas mãos, percorrem impressões submissas à imaginação e ao pensamento. Este conjunto gerador de impressões é o que se denomina experiência. Segundo Rupert Spira, a consciência é aquilo EM QUE a experiência aparece, COM QUE a experiência é conhecida, DE QUE a experiência é feita. Ao ME situar, ME posicionar, afirmar a mim mesmo na experiência, desconsiderando à verdade, enquanto des-encobrimento da consciência, no que se dá, somos levados por esta paixão do orgulho, ao sonho da separação. Eis a queda, eis o pecado original…

EVANGELHO DE JESUS: OLHOS BONS; ABRIRAM-SE OS OLHOS

René Guénon: OLHO

Frithjof Schuon: OLHO (trad. Antonio Carneiro)

O olho, em razão de sua correspondência particularmente adequada com o Intelecto, se presta, por assim dizer, espontaneamente ao simbolismo tradicional, e o encontra, qualquer que seja, em graus de importância muito diversos, na linguagem simbólica de todas as Revelações. Os outros órgãos sensoriais — ou mais geralmente as faculdades que os veiculam — são suscetíveis, é fato, de aplicações análogas, mas, de uma alçada menos central, poder-se-ia dizer: correspondem mais às funções distintas e pertinentes, secundárias da inteligência, ou ainda à modos fundamentais de receptividade e de assimilação cognitiva, o que significa que demonstram menos diretamente que o olho — ou a visão — a analogia entre os conhecimentos sensível e espiritual; somente a visão representa, dentre as faculdades de sensação, o Intelecto concebido como tal e em seu princípio. Esta correspondência evidente entre a visão e o Intelecto mantém-se ao caráter estático e total daquela: a visão realiza, com efeito, de uma maneira simultânea, — e ao mesmo título que o espaço, que lhe corresponde entre as condições da existência corporal, — as muitas possibilidades as mais expandidas no domínio do conhecimento sensível, enquanto que os outros sentidos não reagem senão sob as influências tendo uma relação com a sensibilidade vital; é necessário, entretanto, fazer exceção à audição que, ela, reflete a intelecção, não só estática e simultânea, mas, dinâmica e sucessiva, e que, por relação à visão, representa um papel que poder-se-ia chamá-lo lunar; é por isso que se acha ligada, não só ao espaço, mas ao tempo, o audível se situando totalmente na duração. O que quer que seja, a sensação a mais importante — ou digamos aquela que é intelectualmente a mais explícita — é incontestavelmente aquela da luz, qual que possa ser alhures a importância do som primordial e dos perfumes, gostos e toques espirituais ; somente a visão nos comunica a existência de corpos celestes incomensuravelmente distantes e perfeitamente estranhos a nossos interesses vitais, e pode-se então dizer que somente ela é essencialmente objetiva. É, por consequência, mais que natural, comparar a luz ao conhecimento e a obscuridade à ignorância, e é o que explica o extenso uso que fazem as línguas mais diversas, e acima de tudo, os Textos sagrados, do simbolismo da luz e da visão de uma parte, e daquele da obscuridade e da cegueira de outra parte.

Ananda Coomaraswamy: CORPO E OLHOS; OLHOS; SOPROS E CANAIS

En el aspecto de este simbolismo que se refiere a la condición temporal, el Sol y el ojo derecho corresponden al futuro, la Luna y el ojo izquierdo al pasado; el ojo frontal corresponde al presente, que, desde el punto de vista de lo manifestado, no es más que un instante inaprehensible, comparable a lo que es en el orden espacial, el punto geométrico sin dimensiones: por eso es por lo que una mirada de este tercer ojo destruye toda manifestación ( lo que se expresa simbólicamente diciendo que lo reduce todo a cenizas ), y es por eso también por lo que no es representado por ningún órgano corporal; pero, cuando uno se eleva por encima de este punto de vista contingente, el presente contiene toda realidad ( de igual modo que el punto encierra en sí mismo todas las posibilidades espaciales ), y cuando la sucesión se transmuta en simultaneidad, todas las cosas permanecen en el “eterno presente”, de suerte que la destrucción aparente es verdaderamente la “transformación”. Este simbolismo es idéntico al del Janus Bifrons de los latinos, que tiene dos rostros, uno vuelto hacia el pasado y el otro hacia el porvenir, pero cuyo verdadero rostro, el que mira el presente, no es ni uno ni el otro de los que se pueden ver. — Señalamos también que las nadis principales, en virtud de la misma correspondencia que acaba de indicarse, tienen una relación particular con lo que se puede llamar, en el lenguaje occidental, la “alquimia humana“, donde el organismo es representando como el athanor hermético, y que, aparte de la terminología diferente empleada por una y otra parte, es muy comparable al Hatha-yoga.

A Divindade aparece dotada de visão antes mesmo de se engajar no ciclo de sua manifestação. A este nível, Boehme a apresenta como um olho. A Divindade está inteiramente neste olho que é menos um órgão que uma visão. Toda beatitude divina está na visão simbolizada pela Sabedoria em que Deus pôs toda sua complacência. Deus vê pela Sabedoria que aparece logo no princípio de suas vias, antes mesmo que se engaje o ciclo septiforme. Este último começa com as trevas. Há logo uma visão que precede as trevas e que simboliza a Sabedoria. Esta concepção, precisemos, não se encontra ainda na primeira obra de Boehme, AURORA NASCENTE. Ela se elabora ulteriormente. Nós a desenvolveremos nos dois capítulos consagrados à Sabedoria.

Parece que se possa considerar esta visão primordial ao nível da Deidade suprema e independentemente do ciclo de sua emanação septiforme. Mas de fato o olho aparece em um momento onde a Divindade se prepara para sair dela mesma para inaugurar este ciclo, onde este movimento já se principia. O olho primordial representado pela Sabedoria hipostasiada se situa no limiar mesmo da manifestação divina. A visão que simboliza, prefigura o desejo que ela vai engendrar, ela disto é inseparável. A visão desperta o desejo, ela não se concebe sem ele. Ela não poderia ser o fato de uma Divindade repousando nela mesma, se bastando a ela mesma em um estado de pura indeterminação.

Desde o momento que a Divindade aparece como um olho, ela já se duplicou para dar nascimento a sua emanação. O nascimento da Sabedoria é o princípio desta duplicação. A Sabedoria é por excelência o símbolo da Divindade que se comunica. Temos agora dois aspectos do Divino: por um lado um Absoluto incomunicável, por outro, uma Divindade que se extravasa para se revelar.