Coomaraswamy (Civilização) – Metanoia e Daimon

Metanoia é uma “mudança de mente” que só difere em sua implicação mais ampla da mudança de mente que teve lugar quando nos arrependemos de uma intenção. Quando fazemos isso é porque no momento estamos nos sentindo “mais bem informados” e por isso capazes de agir ponderadamente ou, como diria Platão, ”kata logon”. Com quem estamos nos aconselhando? Neste ponto Sócrates não tem dúvidas, pois diz: “Quando eu estava a ponto de atravessar o rio, foi-ME dado o sinal daimoniano, que normalmente ME vem (e sempre ME impede de fazer o que quero) e pensei ter ouvido uma voz que vinha dele e ME proibia…” (Fedro, 242B)1. Ou, como Platão também diz: “Na alma existe alguma coisa que pede que o homem beba e há algo que o impede, algo diferente da coisa que pede”, o que nos impele a ser paixões e desejos, e nos serve de empecilho à voz da Razão (República, 439). Todo mundo já passou por isso.

Achar que a Mente deve ser “abençoada com um gênio bom” (eudaimon), mas depender unicamente da nossa mente, que é instável, é ser “amaldiçoado com um gênio mau” (kakodaimon, Fílon, 1.37.38). O nosso “livre-arbítrio” não consiste em fazer o que quisermos (isto é, o que temos de fazer por um impulso “natural”); consiste numa opção de guias, numa escolha entre os Gênios do bem e do mal, entre o “Demônio bom” e o Mal, que tem uma multidão de nomes.

(zotpress items=”{3829881:WLJ4ZB93}” style=”associacao-brasileira-de-normas-tecnicas”)


  1. É um tanto estranho o fato de num contexto Sócrates supor que “o sinal daimoniano (demoníaco) chegou para poucos ou para ninguém antes de mim” (República, 496C), mas isso foi desmentido em outros lugares, especialmente no Timaeus, 90D e em Phaedo, 107D; cf. Odisseia III.26. 

Ananda Coomaraswamy