ReichPMF
Um trabalho terapêutico extenso e consciente com o caráter humano confirmou minha convicção de que, ao julgar as reações humanas, devemos levar em conta, em princípio, três camadas diferentes de estrutura biopsicológica. Essas camadas da estrutura do caráter são, como expliquei em meu livro Análise do Caráter, sedimentos da evolução social, sedimentos que agem independentemente. Na camada superficial de seu ser, o homem médio é reservado, cortês, compassivo, ciente de seu dever e consciente. O animal humano estaria alheio à tragédia social se essa camada superficial estivesse em contato direto com o núcleo profundo de sua natureza. Infelizmente, esse não é o caso: a camada superficial de cooperação social não tem contato com o núcleo biológico profundo da pessoa; ela é sustentada por uma segunda camada de caráter, a camada intermediária, que é composta exclusivamente de impulsos cruéis, sádicos, luxuriosos, gananciosos e invejosos. Essa última camada representa o “inconsciente” ou “reprimido” de Freud ou, na linguagem da economia sexual, a soma de todos os “impulsos secundários”.
A biofísica orgônica foi capaz de explicar o “inconsciente” de Freud, ou seja, o elemento antissocial no homem, como o resultado secundário da repressão dos impulsos biológicos primários. Se penetrarmos por essa segunda camada de perversão até a base biológica mais profunda do animal humano, geralmente descobrimos a terceira camada, a camada inferior, que chamamos de núcleo biológico. Nesse núcleo, o homem é — dadas as circunstâncias sociais certas — um animal honesto, trabalhador, cooperativo e amoroso que, em um determinado contexto racional, também sabe odiar. Entretanto, é impossível afrouxar a estrutura de caráter do homem atual e penetrar em sua camada profunda e promissora sem antes remover a camada superficial, inautêntica e falsamente sociável. Se a máscara da civilidade cai, o que emerge não é a sociabilidade natural, mas a camada perversa e sádica.
A consequência dessa estruturação infeliz é que qualquer impulso natural, social e libidinal que, saindo do núcleo biológico, deseja agir, tem de passar pela camada de impulsos perversos secundários que o desvia. Esse desvio transforma o caráter primitivamente social dos impulsos naturais em perversão e inibe qualquer expressão autêntica da vida.