Schuon (EPV) – Multiplicidade Véus

Frequentemente, fala-se de uma profusão de Véus, o que evidencia a complexidade do velamento ou, mais precisamente, os graus ontológicos e existenciais e, também, do ponto de vista humano, o caráter provisório e não-irremediável da separação. A pluralidade do Véu promete um movimento progressivamente acolhedor ou, pelo contrário, faz temer um movimento inverso, de exclusão sucessiva.

O Véu que se abre suavemente representa a acolhida em alguma bem-aventurança; o Véu que se abre de forma brusca — ou o rasgamento do Véu — significa, pelo contrário, um fiat lux súbito, uma iluminação deslumbrante, um satori como diriam os zenistas, caso não seja — na escala cósmica — um dies irae: a irrupção inesperada de uma Luz celeste simultaneamente vingadora e salvadora, enfim equilibrante. Quanto ao Véu que se fecha de forma suave, ele o faz caridosamente e sem intenção de rigor; se, pelo contrário, se fecha bruscamente, representa uma desgraça.

Gostaríamos de mencionar aqui, a título de ilustração tradicional do mistério do desvelamento, o rasa-lila, a dança das gopis em companhia de Krishna, assim como o roubo dos saris por Krishna, por ocasião de um banho das gopis. A perda das vestimentas significa, em cada um desses casos, um retorno à Essência, seja no êxtase do completo abandono a Deus, como no primeiro exemplo, seja pela prova espiritual, como no segundo. O roubo dos saris simboliza a perda da individualidade no amor a Deus; em seguida, a sua restituição num plano superior, o do desprendimento; mas pode também simbolizar, de maneira mais geral, a exigência divina de que a alma compareça nua perante o seu Criador. E lembremos que a vestimenta é uma imagem não só da individualidade como também do formalismo exotérico, devendo as duas exterioridades serem transcendidas de uma forma ou de outra e, em seguida, retomadas num plano superior e com nova intenção. Transcendência intelectual no primeiro caso, relativizando as formas a priori e universalizando-as a posteriori; transcendência moral no segundo, objetivando primeiro o ego e, em seguida, reanimando-o com um perfume de infância santa.

O simbolismo do Véu amplia-se quando se considera um novo elemento que se superpõe, ou seja, o bordado, a tecelagem ornamental, a estamparia decorativa. O véu assim enriquecido sugere o jogo de Maya em toda a sua diversidade e em toda a sua gradação, assim como o faz, acentuando o desdobramento, a misteriosa plumagem do pavão, ou como o faz um leque pintado que ao se abrir põe à mostra sua mensagem e seu esplendor. Tanto o pavão como o leque são emblemas ou atributos de Vishnu; frisemos que no Extremo Oriente, e em qualquer outra parte, o leque é um instrumento ritual que, como a Maya universal, pode simultaneamente se abrir e se fechar, manifestar e reabsorver, acender e apagar. Seja qual for a imagem, o desdobramento é a projeção da Existência que manifesta todas as virtualidades; o fechamento é a reintegração na Essência e o retorno à plenitude potencial. O jogo de Maya é uma dança entre a Essência e a Existência, sendo esta o Véu e aquela a Nudez. E a Essência é inacessível ao existente como tal, segundo os dizeres da inscrição na estátua de Isis em Saís: “Sou tudo o que foi, tudo o que é e tudo o que será; e jamais mortal algum levantou o meu véu”.

Frithjof Schuon