Em outras palavras, o mundo é um imenso túmulo, uma oficina onde novas formas são feitas a partir dos restos daqueles que o deixaram, mas formas que reproduzem infalivelmente os mesmos modelos, as mesmas situações. É por isso que Khayyam chama o mundo de “velha estalagem” (kohne robât), de “deserto do nada”, ou de banquete servido onde se amontoam os restos de reis e mendigos, em outras palavras, todo o espetáculo desolador que se situa entre os dois nada, onde, no final, nada faz sentido, nem o céu nem o inferno, nem o retorno à origem, nem a escatologia, nem nada mais. Aqui, Khayyam destrói, com aforismos contundentes e lucidez intransigente, todas as ilusões metafísicas que as pessoas criaram para si mesmas ao longo dos tempos.
Mas o espaço entre as duas portas [nascimento e morte] também é um espetáculo de insanidade teimosamente repetida. Khayyam usa as imagens do oleiro, do jarro, dos membros espalhados de seres decompostos, comparados às metamorfoses da argila, para mostrar a ilusão repetitiva dos fenômenos. Ao antecipar a iminência do que vai acontecer comigo, vou além da morte ao suspender o ato de antecipação que é o momento. O momento é uma ruptura fora da sequência iminente do evento, na medida em que elimina sua surpresa, desarma-o, tornando nulo e sem efeito seu ataque repetido. Se os gramados que estamos admirando no momento são um “lugar de contemplação” (tamâshâgah) para nosso olhar deslumbrado, a grama que cresce de nossos restos será um lugar de contemplação para os outros que nos seguirem. Essa grama tenra que pisoteamos com nossos pés só poderia ter crescido ao nos alimentarmos dos restos mortais de uma bela feiticeira. Mais uma vez, o que continua voltando não é o homem, já que Khayyam não se cansa de repetir que não há retorno; o que continua voltando é o ritmo demente de situações semelhantes.