Tag: Literatura

  • Kafka, O Processo e o Castelo

    Calasso, 2002 O processo e O castelo são histórias em que se trata de concluir um trâmite: livrar-se de um procedimento penal, confirmar uma nomeação. O ponto em torno ao qual tudo gira é sempre a eleição, o mistério da eleição, a sua obscuridade impenetrável. No Castelo, K. deseja a eleição — e isso complica…

  • Kafka, o mínimo de elementos do mundo em seus cenários

    Calasso, 2002 No início, há uma ponte de madeira coberta de neve. Nevoeiro cerrado. K. ergue o olhar “para o que parecia ser o vazio”, in die scheinbare Leere. Ao pé da letra: “para o vazio aparente”. K. sabe que há alguma coisa naquele vazio: o Castelo. Jamais o viu, talvez jamais ponha os pés…

  • A Fonte da Vida (O Romance da Rosa)

    Jean de Meung, O Romance da Rosa A Fonte da Vida (“Sermão de Genius”) A fonte da qual vos falo é um manancial saudável, belo e maravilhoso. Ouvi-ME atentamente: suas águas têm um sabor agradável e são boas para os animais melancólicos; surgem claras e vivas de três mananciais admiráveis, que estão próximos uns dos…

  • A Arte da Alquimia (O Romance da Rosa)

    Jean de Meung, O Romance da Rosa A arte que ensina a alquimia é capaz de tingir todos os metais em diversas cores—pois morreria antes de transmutar as espécies, caso não consiga reduzi-las à matéria-prima—; atua enquanto há vida, mas nunca poderá igualar a Natureza. E, desejando compreender como alcançá-la, será necessário saber como obtê-la…

  • O Romance da Rosa de Jean de Meung (Kanters & Amadou)

    Kanters & Amadou, 1976 Das duas partes que compõem O Romance da Rosa, não há dúvida de que a escrita mais recentemente, por volta de 1277, apresenta ao mesmo tempo um caráter mais hermético, tanto em seu conteúdo quanto em sua forma. Frequentemente se destacou a obscuridade aparente dessa segunda parte, para a qual a…

  • “Poema Sacro” da Divina Comédia (Canteins)

    CanteinsD O segundo ponto é a qualidade de “Poema Sacro” da Divina Comédia. A expressão é do próprio Dante, que a emprega duas vezes no Paraíso. A raridade e a exclusividade desse uso são significativas: à medida que desenvolvia sua obra, Dante tomou consciência mais precisa da natureza do texto que estava criando e comunicou…

  • Interferência entre a vida terrena de Dante e sua Peregrinação no Além. (Canteins)

    CanteinsD Quando, na véspera da Sexta-Feira Santa do ano 1300, Dante está prestes a empreender sua extraordinária viagem, ele está no meio de sua vida: prestes a completar trinta e cinco anos. Ele próprio estima, no Convivio (IV. xxiii e especialmente IV. xxiv.1-4), que a duração da vida humana é de setenta anos (o excedente,…

  • Dante faz de uma peregrinação, uma revelação (Canteins)

    CanteinsD Tendo se proposto a explicar sua concepção da vida após a morte por meio de uma peregrinação sobrenatural sucessivamente pelo Inferno, Purgatório e Paraíso, Dante se viu obrigado a lidar com várias noções que a Igreja define como Mistérios, ou seja, verdades que, embora inacessíveis à razão, derivam essencialmente da revelação divina. Dante foi…

  • Dante justifica o título [Divina] Comédia (Canteins)

    CanteinsD Na Epístola XIII a Can Grande délia Scala, Dante justifica o título [Divina] Comédia pelo fato de que o final é feliz, enquanto o início não é. Portanto, foi com base no final de sua Peregrinação que Dante pôde dar esse título ao seu poema. Se, como ele mesmo diz, o início é trágico,…

  • “Considerai a doutrina que se oculta sob o véu de versos insólitos” (Canteins)

    CanteinsD Essa reserva em relação ao esoterismo não impede a consideração da “alegoria”; esta é tão inerente ao pensamento e à formulação de Dante que não se pode estudar o Poeta sem constatar seus recursos infinitos e a polissemia resultante, tão propícia a dissuadir os literalistas empedernidos. Encontraremos muitos exemplos ao longo das páginas, mas,…

  • “O Idiota” de Dostoiévski (Abellio)

    AbellioANG Você estará diante dos eventos convulsivos que marcaram os últimos meses da vida consciente do príncipe Mychkine, o único de seus grandes heróis que Dostoiévski quis absolutamente bom, e que essa bondade levou à loucura. O que é o príncipe Mychkine? Sem dúvida, o lado luminoso do próprio Dostoiévski, cujo Stavróguin de Os Demônios…

  • Problema do assassinato em Dostoiévski (Abellio)

    AbellioANG Quando se fala do problema do assassinato em Dostoiévski, é preciso sempre se referir aos diálogos de Aliocha e Ivan Karamázov, onde esses limites da moral são manifestos, mas onde o conhecimento, por sua parte, não aparece. À pureza bíblica de Aliocha, sabe-se que Ivan Karamázov opõe perguntas sem piedade. Para tornar o conjunto…

  • “O Adolescente” de Dostoiévski (Abellio)

    AbellioANG Dos cinco grandes romances de Dostoiévski, este é o menos conhecido, aquele cujas riquezas são as mais secretas. Entre as duas construções gigantescas de Os Demônios e Os Irmãos Karamazov, e à sua sombra, O Adolescente é como um vasto parque cheio de arbustos e matagais, atravessado por caminhos sinuosos que não levam a…

  • Os Cahiers carregam originalidade do viés anti-filosófico de Valéry

    Signorile1993 A criação abre o caminho para o conhecimento, porque o conhecimento está ligado ao aprendizado sobre a ação e suas obras. Essa posição é suficiente para justificar a relevância filosófica dos Cahiers. Ela permite, inclusive, explicar as variações destes últimos, ao sabor das consequências e das discussões em meio às quais eles se desenvolvem.…

  • A aparente desordem dos Cahiers de Valéry

    Signorile1993 A aparente desordem e a repetição temática [nos Cahiers de Valéry] são inicialmente desconcertantes, ainda mais porque essa é uma filosofia profundamente racionalista e móvel. A todo momento, o leitor é convidado a traçar um paralelo entre o racionalismo de Descartes e o evolucionismo de Bergson. Mas se, em ambos, Valéry considera a Razão…

  • Unidade da filosofia de Valéry

    Signorile1993 A unidade da filosofia de Valéry não é imediatamente óbvia. A profusão e a aparente desarticulação dos Cahiers, bem como a recusa do autor em explicitar publicamente os principais princípios filosóficos de seu pensamento, são duas razões para isso. De fato, a impressão de desordem que surge ao entrar em contato com esse corpus…

  • Abellio, obra literária

    (Hanegraaff2006) Os ensaios, obras de ficção e autobiografias de Abellio precisam ser compreendidos no contexto dessa dinâmica (da Estrutura Absoluta). Eles refletem um processo contínuo cujo termo final ele chama de “assunção” (Abellio utiliza prontamente terminologia cristã: batismo, comunhão, assunção, etc.) da multiplicidade do mundo no “Homem Interior”. O Homem, assim, seria capaz de alcançar…

  • Charles Williams, esoterismo na obra literária

    (CW2018) Cada um dos romances de Williams explora uma diferente terra incognita de simbolismo e práticas ocultistas. Shadows of Ecstasy (1925-1932, publicado em 1933) apresenta um poderoso ocultista que dominou a transmutação alquímica do eu; Many Dimensions (1931) revisita a alquimia, combinando a lendária Pedra Filosofal com a pedra cabalística de Schethiya na representação da…

  • Goethe – Fausto e Helena

    (Hadot2018) “Então o espírito não olha nem para frente, nem para trás. Só o presente é nossa felicidade”. Quando, no Fausto II, o herói de Goethe pronuncia essas palavras, parece haver alcançado o ponto culminante de sua “busca da mais elevada existência”. A seu lado, no trono que fez erguerem para ela, está sentada Helena,…

  • Goethe, luz irradiada pelas obras-primas

    (Deghaye2000) Assim, quando Goethe fala da luz irradiada pelas obras-primas, ele imita uma tradição religiosa. No entanto, os trovões e relâmpagos que acompanham o nascimento de Cristo exigem uma reflexão. Certamente, pode-se simplesmente dizer que houve uma tempestade, o que é verdadeiro, pois Goethe o especifica. Mas essa tempestade não teria um sentido simbólico? O…