A interpretação real da “pedra angular” como “pedra do topo” parece ter sido muito bem conhecida de um modo geral na Idade Média, tal como mostra em particular uma ilustração do Speculum Humanae Salvationis que reproduzimos aqui. Essa obra foi muito difundida, pois existem dela ainda várias centenas de manuscritos. Vemos nessa ilustração dois pedreiros com uma colher numa das mãos e, com a outra, sustentam a pedra que se preparam para colocar no topo de um edifício (aparentemente a torre de uma igreja, onde a pedra deve completar o topo), o que não deixa qualquer dúvida quanto à sua significação. É oportuno observar, a respeito dessa figura, que a pedra em questão, enquanto “chave de abóbada”, ou em qualquer outra função similar, de acordo com a estrutura do edifício que irá “coroar”, só pode, em virtude de sua própria forma, ser colocada pelo alto (sem o que, aliás, é evidente que poderia cair no interior do edifício). Por isso, ela representa de algum modo a “pedra descida do céu”, expressão que se aplica muito bem a Cristo, e que lembra também a pedra do Graal (o lapsit exillis de Wolfram von Eschenbach, que pode ser interpretado como lápis ex coelis). Existe ainda um outro ponto importante a ser assinalado: o sr. Erwin Panofski observou que essa mesma ilustração mostra a pedra sob o aspecto de um objeto em forma de diamante (o que a aproxima de novo da pedra do Graal, igualmente descrita como tendo sido talhada em facetas). Essa questão merece ser examinada de perto, pois embora tal representação esteja longe de ser o caso mais geral, liga-se a outros aspectos do complexo simbolismo da “pedra angular”, além daqueles que estudamos até aqui, e que também são interessantes para destacar os seus laços com todo o conjunto do simbolismo tradicional. (Guénon)
Existe nas pedras de base dos quatro ângulos, como que um reflexo e uma participação da verdadeira “pedra angular” ou “pedra do topo”. Aqui, pode-se muito bem falar ainda de reflexo, mas trata-se de uma relação mais direta que na precedente, pois a “pedra do topo” e a “pedra fundamental” situam-se sobre uma mesma vertical, de modo que esta última é como que a projeção horizontal da primeira sobre o plano da base. (Guénon)