montanha

Há, portanto, uma estreita relação entre a montanha e a caverna, na medida em que ambas são tomadas como símbolos dos centros espirituais, tal como ocorre aliás, por razões evidentes, com todos os símbolos “axiais” ou “polares”, dentre os quais a montanha é, na verdade, um dos principais. Lembraremos que, sob esse aspecto, a caverna deve ser vista como situada sob a montanha ou no seu interior, de modo a encontrar-se também no eixo, o que reforça ainda mais o laço existente entre esses dois símbolos, que são, de algum modo, complementares entre si. É preciso, no entanto, observar também, para situá-los exatamente em sua relação, que a montanha tem um caráter mais “primordial” que a caverna. Isso resulta do fato de a montanha ser visível do exterior, sendo ela própria, poderíamos dizer, o que há de mais visível de todas as partes, enquanto que a caverna, ao contrário, constitui-se, como dissemos, num lugar essencialmente oculto e fechado.

Pode-se com facilidade deduzir que a representação do centro espiritual pela montanha corresponde em essência ao período original da humanidade terrestre, durante o qual a verdade encontrava-se integralmente acessível a todos; daí o nome Satya-Yuga (“período da verdade”) e o fato de o topo da montanha ser então o Satya-Loka ou o “lugar da verdade”. Mas, quando, em consequência da progressão descendente do ciclo, essa mesma verdade passou a estar ao alcance apenas de uma “elite” mais ou menos restrita (o que coincide com o começo da iniciação, entendida no seu mais estrito sentido) e tomou-se oculta para a maioria dos homens, a caverna ficou sendo o símbolo mais apropriado para o centro espiritual e, por conseguinte, para os santuários iniciáticos que são sua imagem. Para uma tal mudança, poderíamos dizer, o centro não abandona a montanha, mas apenas se retira do topo para o interior. Por outro lado, essa mudança é de algum modo uma “inversão”, pela qual, como explicamos em outra oportunidade, o “mundo celeste” (ao qual se refere a elevação da montanha acima da superfície terrestre) torna-se em certo sentido o “mundo subterrâneo”, (embora, na realidade, não seja ele que tenha mudado, mas, sim, as condições do mundo exterior, e consequentemente sua relação com este). Tal “inversão” encontra-se figurada por esquemas específicos da montanha e da caverna, que exprimem, ao mesmo tempo, sua complementaridade. (Guénon)