… É possível ler mil páginas de Madame Guyon, Swedenborg e, acima de tudo, Jacob Boehme, sem entender nada. Você saberá por quê. Aos olhos desses crentes, tudo é demonstrado: não passam de gritos de convicção, salmos de amor entoados para celebrar o gozo contínuo, exclamações arrancadas deles pela beleza do espetáculo! Dir-se-ia o clamor de um povo inteiro assistindo a um espetáculo de fogos de artifício no meio da noite. A despeito dessas torrentes de frases desordenadas, o todo é sublime e os argumentos são rápidos como um relâmpago, quando a mente os extrai desse grande farfalhar de ondas celestiais. Imagine o mar visto de relance; ele o encanta, o transporta, o encanta! Mas você está em um cabo, tem vista para ele, e o sol lhe dá uma fisionomia que lhe fala do infinito. Se você começa a nadar nele, tudo fica confuso; você o vê em toda parte como ele mesmo, as linhas do horizonte lhe escapam, ondas em toda parte, verde-escuro em toda parte, e a monotonia de sua voz o cansa; então, para ter uma intuição do infinito demonstrado nesses livros vertiginosos, você tem que subir em um cabo; o espírito de Deus então lhe aparece nas águas, você vê um sol moral iluminando-as. “1
Prefácio (1835) ao Livre mystique (Les Proscrits, Louis Lambert, Séraphita), em La Comédie humaine, t. XI, Paru, Gallimard, “Bibliothèque de la Pléiade”, 1959, PP. 270-271. A barreira espinhosa”, escreve Balzac novamente nesse prefácio, “que, até agora, fez da mística um país inacessível, é a obscuridade, uma falha fatal na França…” (p. 270). ↩