BUDISMO — CHAN — AS DEZ ETAPAS DA ILUMINAÇÃO
”PASTOREIO DO BOI E O ZEN (excertos de “O RETORNO À ORIGEM”, de Lex Hixon)”
1. A PROCURA DO BOI — O Boi jamais realmente se perdeu. Nossa Verdadeira Natureza jamais é perdida e por conseguinte jamais poderá ser encontrada.
A primeira imagem do Pastoreio do Boi, ou fase da Iluminação, denomina-se A Procura do Boi. Ela marca o momento em que ficamos explicitamente conscientes do processo da Iluminação. Imaginamos agora o mistério da nossa Verdadeira Natureza como sendo um objeto de busca. Antes da Procura do Boi, nosso crescimento espiritual ocorreu no disfarce da vida cotidiana, uma vez que todos os desejos expressam, de maneira mais ou menos transparente, o anseio da realização suprema, ou Iluminação. Agora, nós nos tornamos pessoas em busca da espiritualidade, progresso esse indispensável para que concentremos nossa energia consciente na Verdadeira Natureza. Contudo, essa evolução também envolve uma ilusão fundamental, que a tradição Zen apresenta de modo intransigente. Eis o que diz o comentário tradicional a respeito das imagens do Pastoreio do Boi: O Boi jamais se perdeu realmente. Por que então procurar por ele? Ao buscarmos nossa verdadeira natureza, estamos criando uma dualidade ilusória entre aquele que procura e o objeto procurado. Por que procurar a Verdadeira Natureza, que já está presente como a consciência, através da qual conduzimos a busca? Nossa Verdadeira Natureza jamais é perdida e por conseguinte nunca poderá ser encontrada. Não podemos descobrir uma resposta satisfatória para o enigma Por que procurar? e esse não-encontrar-uma-resposta acarreta o cessar gradual da busca que é o florescimento da Iluminação.
O antigo comentário prossegue: Por ter dado as costas à sua verdadeira natureza, o homem não consegue vê-la. Por causa da sua corrupção, ele perdeu o Boi de vista. De repente ele se vê defronte de um labirinto de caminhos entrecruzados. O indivíduo em busca do conhecimento superior é retratado vagando por uma floresta montanhosa ou floresta pluvial. O labirinto de caminhos representa as complexas possibilidades de ação e pensamento em qualquer cultura específica e dentro de cada indivíduo. A pessoa supõe que o Boi tenha tomado um desses caminhos ou desvios, mas por mais sinceramente que siga os vários deles, ela jamais encontrará o Boi da Verdadeira Natureza em qualquer caminho particular. Compreende-se finalmente que o Boi é todo o labirinto de caminhos, a infinita floresta pluvial bem como o indivíduo em busca do conhecimento superior, que vaga por ela. Nossa Verdadeira Natureza nada mais é do que o princípio fundamental do Ser que os mestres Zen também chamam de Mente Original. O comentário descreve essa busca ilusória da Mente Original, que jamais pode ser perdida, mas da qual nos afastamos: Desconsolado e medroso, ele procura, através das florestas, um Boi que não encontra. Subindo e descendo rios escuros, inomináveis e caudalosos em profundos matagais na montanha, ele trilha muitos desvios. Existe alegria e aventura neste estágio da busca, mas também uma crescente sensação de desolação e até mesmo de desespero. O neófito deixou para trás os desejos comuns, apenas para se perder na ambição transcendental. Esta é uma busca impossível, pois o próprio conceito da busca tolda a Verdadeira Natureza que procuramos e que não está além da nossa capacidade atual de ver ou ouvir. O comentário a respeito dessa primeira imagem termina de forma sugestiva: Ao anoitecer, ele ouve cigarras cantando nas árvores. A música das cigarras fornece uma pista sutil da Verdadeira Natureza do neófito. Esse sussurro permeia a floresta, do mesmo modo como a Mente Original permeia todas as estruturas da busca. A pessoa em busca do conhecimento superior está explorando a vastidão ínvia, frustrada e deprimida, mas o suave canto das cigarras é onipresente, permeando-lhe sutilmente todas as dimensões da mente e dos sentidos.