Estrutura do conhecimento simbolista (Abellio)

(Abellio, Serant1955)

O objetivo da coleção “Correspondências” é muito menos recensear analogias “mais ou menos” poéticas do que fundá-las em valor e polivalência significante. É legitimar o simbolismo articulando-o. Mais do que enumerar símbolos, é estruturá-los. O imenso mérito do movimento simbolista em poesia, mérito confirmado além de toda esperança pela experiência surrealista, foi desbridar a poesia. Não se trata hoje de rebridá-la, mas de reconstituí-la — coisa bem diferente — sem perdê-la. Trata-se de fazer passar a poesia do estado de sonho ao estado de vigília sem perder a poesia. De uma espontaneidade primária hesitante em suas escolhas, é preciso fazer uma espontaneidade segunda que nem precise mais escolher. Esta necessidade de rigor tendendo à própria abolição corresponde à exigência platônica. É, no Ocidente, uma empresa sem precedentes.

Podemos antes de tudo destacar a estrutura do conhecimento simbolista?

Tomemos como termo de comparação o próprio conhecimento científico. Como procede a ciência? Ela procede aproximando fatos, sendo a aproximação materializada por um conjunto de mecanismos que permitem medições quantitativas. Mede-se, por exemplo, a pressão e o volume de certa massa de gás e aproximam-se os dois números obtidos para constatar que seu produto permanece constante: daí a lei de Mariotte. A estrutura deste conjunto de operações é fácil de destacar: é uma proporção, ou seja, a relação entre duas relações. De fato, é necessária uma primeira relação para definir a pressão do gás, resultante da aproximação deste gás com o aparelho de medição de pressões. É mesmo a invenção deste aparelho que criou para a ciência o fato “pressão”. Uma segunda relação é igualmente estabelecida para a definição e medição do fato “volume”. A lei emerge enfim de uma terceira relação que resulta da confrontação das duas primeiras, ou seja, dos dois números obtidos nas duas operações preliminares.

A mediação entre os fatos é assim estabelecida por ferramentas, que nos dois primeiros casos são mecanismos materiais de medição, e no terceiro a própria matemática — ferramenta de outro tipo, mas ferramenta ainda assim — e é o caráter “objetivo” destes instrumentos que funda a objetividade da lei, permitindo abstrair a “equação pessoal” do experimentador. Dito isto, seria fácil generalizar e demonstrar que toda intuição, todo juízo se moldam sobre uma estrutura semelhante. Esta similitude é particularmente clara no caso do raciocínio por analogia: A está para B assim como C está para D. Só que, no caso mais geral, as mediações entre os termos e entre as relações não são mais asseguradas por mecanismos “objetivos”, mas pelo próprio observador. Daí o caráter “subjetivo” da intuição e do juízo por analogia, caráter que a ciência se esforça para reduzir a fim de tornar a intuição não só evidente mas adequada.

 

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