HUSTON SMITH — WHY RELIGION MATTERS (Porque as religiões importam)
Excertos do capítulo 2
Contradições entre as visões de mundo tradicional e moderna:
-*Na tradicional o espírito é fundamental e a matéria derivativa. A matéria introduz-se no mar de espírito apenas ocasionalmente, como icebergs. A visão de mundo moderna ou científica vira isto de ponta cabeça, restringindo a consciência (que é o mais próximo que a ciência chega do espírito) a atributos dos organismos complexos, transforma o espírito em minúsculos arroios em um um singular planeta em um deserto aproximadamente 15 bilhões de anos-luz ao redor.
-*Na visão de mundo tradicional os seres humanos são o menos que derivou do mais. Vestígios de glória ainda carregam dentro de si, traços de sua nobre origem. São criaturas de seu Criador, ou (afirmado filosoficamente) emanações do Uno que contém toda perfeição. A visão moderna reverte esta etiologia, posicionando a humanidade como o mais que derivou d menos. de um universo desprovido de senciência no início, a vida eventualmente emergiu, e de sua forma mais simples avançou à estatura mais elevada que os seres humanos dispõem. Nada no universo científico é mais inteligente que nós somos.
-*A visão tradicional aponta para um “final feliz”; a visão científica não. Na família abraâmica tanto as almas individuais quanto a história como um todo tem um final feliz. A história tem seu clímax na vinda do Messias (Judaísmo), na segunda vinda do Cristo (Cristianismo) e na vinda do Mahdi (Islamismo), o Retamente Guiado, que aparece antes do fim dos tempos e restauram os laços entre céu e terra até que o tempo encerre (Islã). O céu provê o final feliz para as almas individuais, mas a doutrina da danação eterna no inferno intromete-se aqui. Diferentemente das tradições ocidentais, as tradições da Índia consideram o samsara (o mundo que conhecemos) como irredimível, mas tanto Hinduísmo com Budismo, como tradições menores da Índia, ensinam a possibilidade de se escapar do samsara para o Nirvana. As tradições do Extremo-Oriente aceitam em grande parte o Budismo como tradição dominante.
-*Criados intencionalmente pela Perfeição onipresente — ou fluindo desta Perfeição “como uma fonte permanente”, no dizer de Plotino — o mundo tradicional guarda significado e um sentido profundo. Na visão científica, o sentido não passa da “pele” formada apenas por organismos biológicos em uma cantinho minúsculo do universo sideral.
-*Na visão tradicional as pessoas se sentem em casa. Pertencem a seus mundos, pois foram feitas do mesmo estofo senciente que o mundo é feito. O poeta polonês Czeslaw Milosz vê na visão científica do mundo a alvorecer de uma “era de desabrigados” (poderíamos dizer de “sem-tetos” lembrando do desenraizamento criticado por Simone Weil).