gr. ethos; lat. consuetudo

Chama-se hábito uma disposição de uma potência da alma tendo em vista o fim intencionado pelo sujeito, in ordine ad finem. Dessa relação essencial ao fim, segue-se que o hábito é necessariamente uma modificação boa ou má: uma disposição orientando para o fim autêntico é boa, no caso contrário, é má. Isto posto, ser-nos-á possível perceber o sentido da definição clássica do hábito:
dispositio secundum quam aliquis disponitur bene vel male.

Sob o ponto de vista predicamental, o hábito pertence à categoria qualidade, da qual ele é a primeira das quatro espécies (habitus, potentia, passibiles qualitates, figura). – Observemos ainda que os hábitos podem encontrar-se em diversas potências da alma: apetite sensível, vontade, inteligência. Evidentemente, aqui nos interessam os hábitos que têm como sujeito a inteligência, os hábitos intelectuais.

Aristóteles enumerou cinco deles, três especulativos, (inteligência, ciência, sabedoria) e dois práticos (prudência e arte). Estes dois grupos de hábitos distinguem-se pelo fim intencionado: os hábitos especulativos têm como fim o puro conhecimento, enquanto que os hábitos práticos são ordenados para a ação. Falemos, de início, dos segundos.

Hábitos práticos. – A prudência se distingue da arte por ter como matéria a atividade imanente ou moral, os atos humanos: ela é a regra desses atos (recta ratio agibilium); a arte é o conhecimento racional como regra da atividade exterior ou prática (recta ratio factibilium).

Hábitos especulativos. – A inteligência é a percepção imediata dos princípios. Como já o sabemos, ela não é o resultado da ciência, mas se encontra em seu próprio princípio. A ciência e a sabedoria são igualmente hábitos que nos dispõem ao conhecimento pela causa; porém, enquanto a ciência demonstra pela causa própria e imediata, a sabedoria vai até às causas primeiras. Todas estas distinções são bem analisadas neste texto de Tomás de Aquino (I-II. q. 57, a. 2):

“A virtude intelectual especulativa é a que aperfeiçoa o intelecto especulativo na consideração do verdadeiro, que é sua melhor obra. Ora, o verdadeiro pode ser atingido de duas maneiras: ou enquanto conhecido por si próprio, ou enquanto conhecido por intermédio de um outro. O que é conhecido por si tem papel de princípio e é percebido imediatamente pela inteligência. É devido a isto que o hábito que aperfeiçoa a inteligência com relação a tal percepção é chamado “inteligência”, no sentido de hábito dos princípios. Quanto ao verdadeiro que é conhecido por um outro, ele não é imediatamente percebido pela inteligência, mas por uma pesquisa da razão, e tem um papel de termo final. E isto pode-se produzir de duas maneiras diferentes: de uma parte, de tal maneira que ele seja último em seu gênero particular (de conhecimento); de outra parte, de maneira que ele seja termo último de todo o conhecimento humano… Neste último caso, tem-se a “sabedoria” que considera as causas mais elevadas… Com relação ao que é o último em tal ou tal gênero das coisas conhecíveis, tem-se a “ciência” que desse modo aperfeiçoa a inteligência.”

Vê-se que a ciência é tomada, nesta classificação, segundo sua significação mais restrita, como a demonstração pelas causas inferiores e próximas; neste sentido, as matemáticas e a física são ciências. A sabedoria filosófica superior, a metafísica, é tomada, neste texto, como algo à parte, relativamente à ciência. Relembremos que Aristóteles dá muitas vezes a esse termo de “ciência” uma extensão bem maior, de sorte que a metafísica, que é também um conhecimento pelas causas (pelas causas supremas), pode reivindicar o qualificativo de ciência. (Gardeil)