A definição de sistema como conjunto de elementos relacionados entre si e harmonicamente conjugados não é suficiente para uma dilucidação filosófica. Antes de tudo, põe-se a questão de saber se tais elementos são entidades ou se trata de conceitos ou enunciados. Em segundo lugar, não tem a mesma significação um sistema se é um sistema orgânico ou um sistema mecânico. Na significação que os estoicos davam ao termo, significava primariamente ordem, quer dizer, ordem do mundo segundo a qual não só todo o real estava submetido a uma lei, como, além disso, o pensamento seguia a lei da ordem sistemática. O sistema conceitual era por isso, uma tradução do sistema real. A questão da relação entre o sistema e a realidade implica sempre uma certa ideia do que é o sistema. Costuma-se considerar três formas de relação: 1. O sistema conceitual deriva do real. 2. O sistema real é produto de uma ordem imposta pelo conceitual. 3. sistema real e sistema conceitual são paralelos e, por alguma razão, coincidentes. É óbvio, além disso, que à medida que se acentua a concepção da espontaneidade do pensar se tende a examinar o problema do sistema do ponto de vista da ordem dos conceitos. Assim aconteceu no idealismo, que pela primeira vez precisou e ainda, com Hegel, exaltou a ideia do sistema, e em particular a ideia da filosofia como sistema. Na Dialéctica Transcendental, Kant retomava a sua ideia do sistema como um todo do conhecimento ordenado segundo princípios. Daí a definição: “por sistema entendo a unidade das formas diversas do conhecimento sob uma só ideia”, donde a ideia é o conceito dado pela razão. No entanto, o sistema da razão era, em última análise, resultado de um trabalho infinito. Com maior radicalidade, em compensação, sustenta Hegel a ideia — real e conceitual — do sistema. Embora apenas o total seja verdadeiro, e embora o parcial seja não verdadeiro ou, melhor dizendo, momento falso da verdade, esta será essencialmente sistemática, e a realidade e verdade de cada parte apenas terão sentido em virtude da sua referência e inserção num todo. Daí que, como diz no prefácio à Fenomenologia do Espírito “a verdadeira figura dentro da qual existe a verdade não pode ser senão o sistema científico desta verdade”. A verdade seria, portanto, de acordo com isto, apenas a articulação de cada coisa com o todo, e o próprio todo que a exprime o sistema desta articulação. Desde Hegel pode falar-se, portanto, com pleno sentido, de sistema da filosofia, não porque estes sistemas não tivessem existido já antes, mas porque apenas desde Hegel ressalta e adquire maturidade aquela sistematicidade dos sistemas. Até há pouco considerava-se o pensamento tanto mais filosófico quanto mais sistemático era, e viu-se a história da filosofia como uma sucessão de sistemas. No entanto, surgiu um modo de pensamento no qual não apenas se quebrou o sistema mas, o que mais importa para o caso, chegou-se à plena consciência de um novo modo não sistemático, essencialmente fragmentário, inclusivamente aforístico, adotado pela filosofia. Este modo tem sido considerado por muitos autores como não filosófico. Outros têm visto, em contrapartida, nele o anúncio de um novo modo possível de filosofar, ao qual deixaria de ser sistemático na medida precisamente em que deixaria de se ater às hipóteses racionalistas que, através de múltiplas e díspares formulações têm persistido ao longo da história da filosofia do ocidente. Esta ideia conduziu a uma discussão a fundo do próprio problema do sistema. Esta discussão seguiu duas vias: por um lado, a análise do sistema como sistema formal. Por outro lado, o exame da relação entre pensamento filosófico e sistema.

Alguns autores indicam que a propensão sistemática não é em si mesma nociva; o que é perigoso é, em seu entender, aderir-se a um sistema dado (como o de Hegel) em vez de propugnar um sistema aberto que, sem perder nenhuma das vantagens da ordenação sistemática, seja capaz de acolher os novos problemas e de se modificar continuamente. O tipo de sistema aberto aqui referido é o adotado pela ciência nas suas construções teóricas e pode ser considerado como extremamente fecundo para o conhecimento. Com efeito, podem admitir-se certas estruturas teóricas suficientemente amplas e tentar alojar nelas os novos fatos que se vão descobrindo. Deste modo, os fatos modificam o sistema, mas não o mudam de cada vez completamente. (DFW)