Monstruosité ? dans Le Vase d’or de E.T.A. Hoffmann. Florence Hafner, doctorante
“Monstruosidade” e “monstro” derivam ambos da palavra latina monstrum. Consultando o Dicionário Etimológico da Língua Latina de Ernout e Meillet, descobrimos que, originalmente, monstrum significa “sinal enviado pelos deuses”, “prodígio” e, posteriormente, “objeto ou ser de caráter sobrenatural”. Nesse sentido, não é necessário que o prodígio seja assustador para ser considerado monstruoso. Embora seja compreensível a mudança posterior de significado: o que não compreendemos é, muitas vezes, inquietante aos nossos olhos.
Serpentina e seu pai, o arquivista, por seu caráter divino (imortalidade, comunhão com a natureza) e também por seus poderes, são, portanto, “monstros” no sentido de prodígios.
Isso não impede que a Salamandra provoque terror em Anselmo. Pois é de fato “um sentimento de horror” que ele sente ao observar o “rosto enrugado e esquelético” do velho necromante:
Mas ele também não é desprovido de sedução, pois quando Anselmo acredita ver as pontas de seu manto se desdobrarem e baterem no ar como duas asas gigantescas, é “todo estupefato” que o segue com o olhar, achando que “assistia ao voo irresistível de uma ave imensa”.
Porém, sem dúvida, é Serpentina quem representa o verdadeiro prodígio, a verdadeira sedução do desconhecido. Aquela que o fará renunciar ao real para viver plenamente na poesia (“A bem-aventurança de Anselmo, o que é senão a vida na poesia, à qual se revela o mais profundo mistério da Natureza, a sagrada e universal Harmonia?”).
É ela que, sob a forma de uma pequena serpente verde-dourada, aparece primeiro a Anselmo:
Ele percebia estranhos sussurros, como chiados. Subiam da grama perto dele e se infiltravam nos galhos e folhas do sabugueiro […]. Depois, eram como cochichos e murmúrios.
E mais adiante:
[ele] ouviu novamente o tilintar de sinos e avistou uma serpente que lhe baixava a pequena boca. Um choque elétrico não o teria feito estremecer mais, e sentiu um tremor no mais profundo de si; mas, erguendo os olhos desnorteados, recebeu o impacto de dois olhos esplêndidos, de um azul profundo, carregados de uma nostalgia tão indizível que foi tomado por uma emoção desconhecida.
O erotismo entre o homem e o animal já é palpável nesse encontro totalmente irreal. Tudo se passa como se Anselmo, desde o início, tivesse compreendido que não se tratava de uma simples serpente. Encontramos uma informação interessante sobre isso no artigo “Cobra” do Dicionário do Simbolismo Animal de Jean-Paul Clébert, já que o termo “cobra” foi usado em várias traduções:
“Como todos os répteis, ela é associada nos bestiários à mulher, aos tesouros e ao conhecimento das coisas ocultas.”
E é exatamente isso que Serpentina representa para Anselmo. Ela é a mulher que encarna o caminho para o conhecimento das coisas ocultas, das coisas perdidas da Idade de Ouro às quais o poeta busca acessar e das quais Anselmo será iniciado. Esses “tesouros” que ela guarda são simbolizados por seu dote, o vaso de ouro.
E é sob forma humana que ela finalmente lhe aparece quando ele aceita trabalhar para o Arquivo:
Ele não podia acreditar no que via: uma jovem de beleza maravilhosa se aproximava dele, e seu olhar, carregado de uma nostalgia inefável, tinha o mesmo azul profundo dos olhos que habitavam o fundo de sua alma. […] Ela agora estava sentada com ele na poltrona, abraçando-o e apertando-o contra si; e ele, aspirando o sopro de seus lábios, sentia o calor magnético de seu corpo penetrá-lo.
O monstro, portanto, não parece tão diferente do homem. Essa “nostalgia inefável”, ambos a compartilham. É a nostalgia da Atlântida, a nostalgia da Idade de Ouro perdida, tanto pela humanidade quanto pela pobre Serpentina, que, no entanto, continua sendo sua chave.
Em “Por um mito romântico do relato poético”, Montandon também observa:
“A serpente cantora e encantadora remete a Melusina, à sedutora, à ninfa das águas, à doce sereia. Emblema do mistério, da vida e da alma, essa serpente verde tem olhos azuis, cor romântica, […] cor também da flor da Índia, o lótus, caro aos teósofos e adeptos da metempsicose. Anselmo cede aos encantos dessa figura.”