(…) Assim, em textos que se originaram em ambientes muito diferentes e foram escritos em um período de dois mil anos, os termos que se aplicam à fala — vâk ou akshara, por exemplo — têm valores muito semelhantes. Onde se acredita: no poder e na eficácia, não apenas mágicos, mas também cósmicos e cosmogônicos, de certas fórmulas, os mantras, quando pronunciados corretamente e associados a certos ritos; que alguns desses mantras, e em todo caso um deles : OM, representa a divindade e, portanto, é idêntico a ela, carregado de seu poder, um poder que o homem pode aproveitar se usar os meios apropriados; que esse poder é a Palavra, e que a palavra deve seus poderes não apenas à sua força encantatória, mas ao fato de estar associada ao pensamento, à consciência, que é uma força igualmente grande, ou às vezes até maior, e, de qualquer forma, inseparável da palavra; que a fala também está associada à respiração (prâna), que é a energia vital, cósmica e humana; que o ascetismo, a disciplina do corpo e da respiração e os rituais são os meios disponíveis ao homem para atingir a meta que ele estabeleceu, que, além da eficácia imediata, é a libertação por meio da identificação com a divindade. Todos esses conceitos estão delineados no Veda, elaborados nos Brâhmanas, Àranyakas e Upanishads védicos ou, mais recentemente, e posteriormente desenvolvidos no hinduísmo purânico e tântrico.
A partir do Rigveda, a fala ganha um lugar importante: muitos termos se referem a ela e, em vários lugares, aparece como um primeiro princípio, como uma força criativa da qual o universo se origina. Tanto é assim que foi escrito que “as especulações védicas, conforme expressas nos hinos, repousam em uma espécie de primazia da palavra” — uma primazia que nunca deixará de ser reconhecida.
O termo que, daqui em diante, será usado mais do que qualquer outro para nomear a Realidade suprema, o Absoluto, é um daqueles que, no Veda, designam uma forma da Palavra: brahman. Um termo extraordinário, surpreendente, mas muito atual! No Rigveda, brahman (no gênero neutro; no masculino, é o sacerdote) é a palavra ritual, a “fórmula” por excelência, a palavra suprema. Além disso, é uma palavra sujeita às regras estritas da poética, mas dentro de um sistema de pensamento no qual o poeta ordena o universo cantando-o. Finalmente, Brahman aparece como uma palavra misteriosa, cheia de enigmas: esse caráter misterioso e secreto da Palavra original será encontrado novamente mais tarde, assim como as correspondências postuladas por Brahman, que são essenciais para o pensamento metafísico indiano (como são para todo pensamento mítico). Esse isomorfismo, estabelecido desde o início do pensamento indiano — é um traço arcaico e indo-europeu — entre a divindade e a Palavra, a onipotência e o uso da fala, é fundamental.