SUTRA DA PLATAFORMA
”Excertos de Ricardo Joppert, “O Samadhi do Verde-Azul””
O Sutra da Plataforma parece ser um produto, pelo menos parcialmente, de adeptos do Chan de época posterior à de Huineng. Sua versão original, se existiu, era muito mais reduzida do que a conhecemos hoje1.
Doutrinalmente, o Sutra da Plataforma inspirou-se em vários textos canônicos da corrente do Mahayana, principalmente os Prajnaparamitasutra, o Nirvanasutra, o Vimalakirtinirdesasutra. Os Sutra da Perfeição da Sabedoria formam um grupo de obras, dentre as quais algumas são as mais antigas do Mahayana. “A essência dessa perfeição da sabedoria reside na compreensão da doutrina da vacuidade (sunyata). O budismo primitivo havia reconhecido que todas as coisas compostas (samskyta) são vazias (sunya), impermanentes (anitya), impessoais (anatman) e dolorosas (duhkha), mas essa vacuidade era apenas vacuidade de individualidade (atman) ou de personalidade (pugdala). Para o Mahayana, as coisas não só são vazias de individualidade e de personalidade mas, também, de leis (dharma), isto é, de natureza própria (svabhava). Para retomar uma imagem tornada clássica de Grande Veículo (Mahayana), o budismo antigo assimilava as coisas a vasos vazios, enquanto que o Mahayana nega a substância mesma dos vasos e atinge uma insubstancialidade total: tudo é vazio, tudo se dissolve na vacuidade universal. Note-se bem que essa nova concepção não estava em oposição com a primeira mas era o resultado de seu aprofundamento, o objetivo final desta tendência intelectual que as noções de impermanência, de instantaneidade, de impersonalidade exprimiram desde muito cedo. .. Não se deve ver, entretanto, como se fez frequentemente no Ocidente, um puro filo:niilismo na doutrina da vacuidade. Do fato de que as coisas sejam despidas de natureza própria, não se segue que elas ine.xistam. Elas existem, mas apenas no sentido de que são simples fenômenos… o ser é o joguete das aparências ilusórias das coisas e não pode ser libertado, a não ser que se livre delas e conheça, enfim, a realidade tal como é, isto é, inconcebível (acintya) e inefável (anabhilâpya), porque transcende toda multiplicidade, toda dualidade, em particular a dos pensamentos e das palavras”2.