corrente dos mundos

A “corrente dos mundos” é habitualmente representada por uma série de esferas enfiadas como as pérolas de um colar (v. sutra); e, para dizer a verdade, não seria praticamente possível dar outra figuração sensível.

É importante notar ainda que a “corrente” só pode ser percorrida, na realidade, num único sentido, que corresponde ao que denominamos direção ascendente do eixo (v. acima-abaixo). Isso se torna muito claro quando se utiliza um simbolismo temporal, comparando os mundos ou os estados de existência aos ciclos sucessivos, de tal modo que, em relação a um dado estado, os ciclos anteriores representam os estados inferiores e os ciclos posteriores, os estados superiores, o que implica que o seu encadeamento deve ser concebido como irreversível. Além disso, essa irreversibilidade está de igual modo implicada na concepção do encadeamento como dotado de caráter essencialmente “causal”, pois, ainda que esta na verdade suponha a simultaneidade e não mais a sucessão, na relação de causa e efeito os dois termos não podem jamais ser invertidos. No fundo, a noção de encadeamento causal constitui o verdadeiro sentido daquilo que se traduz simbolicamente sob a aparência de uma sucessão cíclica, enquanto que o ponto de vista da simultaneidade corresponde sempre a uma ordem de realidade mais profunda que a da sucessão.

A “corrente dos mundos” é, em geral, figurada sob forma circular porque, se cada mundo é considerado como um ciclo, e por isso simbolizado por uma figura circular ou esférica, a manifestação como um todo, que é o conjunto dos mundos, aparecerá de certo modo como o “ciclo dos ciclos”. Assim, não só a corrente poderá ser percorrida de uma forma contínua desde sua origem até o seu fim, mas também a seguir poderá ser percorrida de novo, e sempre no mesmo sentido, o que aliás corresponde, no desenvolvimento da manifestação, a um nível diferente daquele em que se situa a simples passagem de um mundo ao outro. E como esse percurso pode prosseguir indefinidamente, o próprio caráter indefinível da manifestação fica assim expressado de uma forma mais sensível ainda. Entretanto, é essencial acrescentar que, se a corrente se fecha, o ponto exato em que isso ocorre não é comparável de maneira alguma aos seus outros pontos, pois não pertence mais à série dos estados manifestados. A origem e o fim se reúnem e coincidem, ou melhor, nada mais são na realidade que uma única e mesma coisa, mas que só pode ser assim porque se situam, não num nível qualquer da manifestação, mas além desta, no próprio Princípio. (Guénon)

René Guénon