Um curioso documento, que representa expressamente Cristo sob os traços de Jano, foi publicado, há alguns anos, pelo sr. Charbonneau-Lassay na Regnabit, o que nos levou a comentá-lo logo depois na mesma revista. Trata-se de um medalhão pintado sobre uma página separada de um livro litúrgico, manuscrito, do século XV, encontrado em Luchon, e que encerra a folha do mês de janeiro no calendário liminar desse livro. No alto do medalhão, figura o monograma IHS dominado por um coração; o restante está ocupado pelo busto de Janus Bifrons, com um rosto masculino e outro feminino, tal como ocorre com grande frequência; traz uma coroa sobre a cabeça, e segura numa das mãos um cetro e na outra uma chave.
“Nos monumentos romanos”, escrevia o sr. Charbonneau-Lassay ao reproduzir esse documento, “Jano aparece, tal como no cartucho do Luchon, com a coroa na cabeça e o cetro na mão direita, porque é rei; segura na outra mão a chave que abre e fecha as épocas; é por isso que, ampliando a ideia, os romanos consagravam-lhe as portas das casas e das cidades… Cristo também, como o Jano antigo, leva o cetro real a que tem direito em nome de seu Pai do Céu e de seus ancestrais neste mundo; e sua outra mão segura a chave dos segredos eternos, a chave tingida pelo seu sangue, que abriu, para a humanidade perdida, a porta da vida. É por isso que, na quarta das grandes antífonas anteriores ao Natal, a liturgia sagrada o aclama assim: ‘O Clavis David, et Sceptrum domus Israeli… Vós sóis, ó Cristo esperado, a Chave de Davi e o Cetro da casa de Israel. Vós abris, e ninguém pode fechar; e quando vós fechais ninguém mais saberia abrir…’ ” (Breviário romano, ofício de 20 de dezembro). [Guénon]