Enquanto houver um “eu” pensando e sentindo, não importa como esse “eu” possa ser concebido, esse “eu” é um objeto e está cativo — pois todos os objetos estão necessariamente cativos.
Mesmo que consiga liberar meu “eu” do medo, do desejo e da afetividade de qualquer tipo ou grau, esse “eu” liberado continua existindo como um “eu”, e não importa se está libertado ou não de qualquer incubo aparente — pois sua subsistência contínua como um centro livre ou não livre é o próprio cativeiro. O medo, o desejo, a afetividade são manifestações da pseudoentidade que constitui o cativeiro; portanto, é a entidade, e não as manifestações dela, que precisa ser eliminada.
Uma entidade deve inevitavelmente estar ligada, pois uma entidade é um objeto do sujeito que afirma ser, e todo objeto de um sujeito está no cativeiro da causalidade aparente.
É por isso que os Mestres afirmaram com tanta frequência que não há diferença entre “iluminação” e “ignorância”, pois em ambas as condições permanece uma entidade conceitual para ser uma ou outra, para experimentar uma ou outra condição.
O que quer que se possa afirmar sobre uma suposta entidade ou “eu”, ou “centro” de qualquer tipo, não é diferente de seu oposto, pois cada um é o aspecto positivo ou negativo de uma inferência, uma interpretação, que parece “existir” e é um conceito na mente. Cada um deles, seja o que for, nem é e nem não é, pois é uma suposição que condiciona uma entidade que é, ela mesma, uma suposição, de modo que a condição, ou seu oposto, ou sua ausência, é um conceito aplicado a um conceito, ou seja, a sombra do que é, ela mesma, uma sombra, cuja substância reside em sua origem enquanto noúmeno.
Somente na ‘noumenalidade’ pode haver ausência de cativeiro, pois noumenalmente não pode haver nenhuma entidade a ser cativa.
Portanto, somente a vida noumênica pode ser livre.