heráldica

Na acepção de uma ciência dos brasões de armas, a heráldica originou-se na Europa no século XII e desenvolveu-se nos dois séculos seguintes até se converter numa requintada disciplina intelectual e artística. A colocação de figuras e peças distintivas no escudo ou no elmo de um cavaleiro era um costume que vinha de tempos imemoriais, mas o desenvolvimento de um método sistemático de identificação de nobres de aspecto semelhante, na guerra e na paz, foi uma característica da sociedade feudal no Ocidente, com sua ênfase sobre o direito hereditário e a sucessão hereditária das terras e da autoridade. A natureza cosmopolita da aristocracia militar era enfatizada pela mobilidade geral característica da Europa do século XII, sobretudo em consequência do movimento das Cruzadas. A concessão de brasões de armas, inicialmente uma incumbência do senhor feudal, logo se tornou uma prerrogativa régia, e exibir ou usar o brasão de outrem equivalia a uma falsificação, a uma fraude. A heráldica abrangia tanto a Igreja quanto a nobreza laica, e figuras e motes heráldicos passaram a ser também usados por guildas e corporações nas cidades.

A variedade era admissível nos primeiros tempos, mas no século XIV normas rigorosas a respeito do uso de brasões passaram a vigorar em todo o mundo ocidental, sendo a obediência às mesmas imposta através de tribunais reais, como o Herald’s College de Londres, criado em 1483 pelo rei Ricardo III, e que era um órgão com o objetivo específico de zelar pela estrita observância dos preceitos contidos no Armorial. A linguagem da heráldica era e ainda é basicamente francesa — uma indicação da posição central ocupada pela França e o Império Angevino na sociedade feudal. O vocabulário mais elaborado dizia respeito à forma como se procede à composição de um brasão de armas, seus formatos e proporções, as partições e subpartições do campo (os diferentes fundos do escudo, que podem ser partidos, talhados, esquartelados, franchados, em pala ou em mantel), sobre os quais se colocam as chamadas peças honrosas do brasão (por exemplo, faixa, banda, aspa, bordadura etc), as cores e matizes (que em heráldica têm o nome de metais — ouro e prata — e esmaltes — azul, verde, preto ou púrpura) e, por fim, as peças móveis, que podem ser figuras e divisas de toda a espécie (animais reais ou fabulosos — como grifos, unicórnios, dragões — plantas, árvores, castelos, utensílios variados, muitas vezes com uma alusão ao nome de família em forma de trocadilho, como “águia” por Aguiar). Os ornatos exteriores obedecem também a regras complicadas para a inserção de elmos fechados ou abertos, coroas, coronetes e chapéus eclesiásticos, de acordo com a classe, a dignidade e a função hierárquica do indivíduo (desde rei, príncipe, duque, conde etc. até abade, cardeal, bispo ou arcebispo) e o aditamento de suportes, tenentes, ornatos, pavilhões ou tarjas aos brasões de família, ou seja, símbolos usados em caso de grande honraria, como esteios para o escudo. Os filhos mais novos e os ramos colaterais também têm seus brasões “diferenciados”.

A heráldica e o papel do arauto (herald) estavam intimamente associados com os conceitos de nobreza, fidalguia e cavalaria, que alcançou sua mais nítida expressão na Europa dos séculos XIII e XIV com a criação de instituições como a Ordem da Jarreteira por Eduardo III da Inglaterra em 1348. (DIM)

DIcionário da Idade Média