René Guénon — O SIMBOLISMO DA CRUZ
O simbolismo das direções do espaço é o mesmo que teremos de aplicar em tudo o que se segue, tanto do ponto de vista “macrocósmico”, como no que acabou de ser dito, quanto do ponto de vista “microcósmico”. A cruz tridimensional constitui, na linguagem geométrica, um “sistema de coordenadas” ao qual todo o espaço pode ser relacionado; e o espaço simbolizará aqui a totalidade de todas as possibilidades, seja de um ser particular ou da Existência universal. Esse sistema é composto de três eixos, um vertical e os outros dois horizontais, que são três diâmetros retangulares de uma esfera indefinida e que, mesmo independentemente de todas as considerações astronômicas, podem ser vistos como orientados para os seis pontos cardeais: No texto de Clemente de Alexandria que citamos, o topo e a base correspondem respectivamente ao Zênite e ao Nadir, a direita e a esquerda ao Sul e ao Norte, a frente e o verso ao Leste e ao Oeste; isso pode ser justificado pelas indicações concordantes encontradas em quase todas as tradições. Também podemos dizer que o eixo vertical é o eixo polar, ou seja, a linha fixa que une os dois polos e em torno da qual todas as coisas realizam sua rotação; ele é, portanto, o eixo principal, enquanto os dois eixos horizontais são apenas secundários e relativos. Desses dois eixos horizontais, um, o eixo Norte-Sul, também pode ser chamado de eixo solsticial, e o outro, o eixo Leste-Oeste, pode ser chamado de eixo equinocial, o que nos leva de volta ao ponto de vista astronômico, em virtude de uma certa correspondência entre os pontos cardeais e as fases do ciclo anual, uma correspondência cuja exposição completa nos levaria longe demais e que, além disso, não é importante aqui, mas que, sem dúvida, encontrará seu lugar melhor em outro estudo.
NOTA: Também podemos notar, a título de concordância, a alusão de São Paulo ao simbolismo das direções ou dimensões do espaço, quando ele fala da “largura, comprimento, altura e profundidade do amor de Jesus Cristo” (Epístola aos Efésios, III, 18). Aqui, há apenas quatro termos distintos em vez de seis: os dois primeiros correspondem respectivamente aos dois eixos horizontais, cada um dos quais é tomado em sua totalidade; os dois últimos correspondem às duas metades superior e inferior do eixo vertical. A razão para essa distinção, no que diz respeito às duas metades do eixo vertical, é que elas se referem a dois gunas diferentes, e até mesmo opostos em certo sentido; por outro lado, os dois eixos horizontais inteiros se referem a um e ao mesmo guna, como veremos no próximo capítulo.