Schuon (EPV) – Subjetividade e Consciencia

Esta questão complexa da subjetividade merece ou exige que lhe consagremos algumas considerações suplementares, com o risco de repetir algum ponto, mas com a esperança de fornecer precisões senão exaustivas pelo menos suficientes.

Há no homem uma subjetividade ou uma consciência feita para olhar o exterior e para perceber o mundo, seja este terrestre ou celeste. Além disso, há no homem uma consciência feita para olhar o interior, em direção ao Absoluto ou ao Si-mesmo, seja esta visão relativamente separativa ou unitiva. Isso equivale a dizer que há no homem uma consciência descendente, que obedece à intenção criadora de Deus, e uma outra ascendente, que obedece à intenção divina salvadora ou libertadora. As duas são incomensuráveis, embora haja entre elas uma região onde se entrecruzam e dão margem a uma subjetividade una e a um equilíbrio existencial entre as duas consciências divergentes. É por essa razão que o homem espiritualmente realizado pode ver Deus nas coisas e, do mesmo modo, os protótipos dos princípios das coisas em Deus. A consciência psíquica e mental percebe as aparências; a consciência intelectual ou do coração percebe a Essência; mas a consciência intermediária vive das duas dimensões simultaneamente. Vendo os fenômenos, ela vê Deus neles e os vê em Deus; percebe que todas as coisas são a manifestação de uma possibilidade divina, de modo analógico ou de modo privativo e, simultaneamente, mas de outro ponto de vista, vê as coisas como que mergulhadas num mesmo ambiente divino. No primeiro caso, os objetos deixam transparecer a Realidade divina ou seus modos, ao passo que, no segundo caso, a subjetividade participa extintiva e unitivamente da Consciência divina.

Em todo caso, a subjetividade humana é um prodígio tão inaudito que basta para provar tanto Deus como a imortalidade da alma: Deus, porque essa subjetividade extraordinariamente ampla e profunda só se explica por um Absoluto que a prefigura substancialmente e que a projeta na acidência; e a imortalidade da alma, porque a qualidade incomparável dessa subjetividade não encontra nenhuma razão suficiente ou nenhum motivo adequado à sua excelência, no âmbito estreito e efêmero da vida terrestre. Se for para viver como formigas, os homens não têm nenhuma necessidade das suas possibilidades intelectuais e morais, é como se dizer que não têm necessidade de ser homens; a própria existência do homem seria, então, um luxo tão inexplicável quanto inútil. Não compreender isso é a mais monstruosa e também a mais misteriosa das cegueiras.

Está salvo o homem que compreende a razão de ser da subjetividade humana; ser, na relatividade, simultaneamente um espelho do Absoluto e um prolongamento da Subjetividade divina. Manifestar o Absoluto na contingência, o Infinito na finitude, a Perfeição na imperfeição.

A salvação exotérica é a fixação do sujeito humano individual, ou da alma, na aura incorruptível do Objeto divino, se assim podemos nos expressar. A salvação esotérica é a reintegração do sujeito humano intelectual, ou do espírito, na Subjetividade divina. Este segundo modo de salvação — a libertação (moksha) dos vedantinos — implica o primeiro modo, pois o homem como tal jamais pode tornar-se Deus. Certamente, a substância imutável do homem, que coincide com o Supremo Si-mesmo, libera-se deste acidente que é o ego; mas não o destrói, assim como a realidade de Deus não impede a existência do mundo.

Frithjof Schuon