SEOL — SHEOL — XEOL
Sheol, Xeol, Sombras
VIDE
O termo “sombra”, hb. sheol, tem vários significados no AT. A Septuaginta constantemente usa o gr. skia para traduzi-lo, e seu derivado salmawet, às vezes traduzido por skia thanatou, “sombra da morte”. Pode ser usado para um sentido concreto como a “sombra da montanha”, embora não se mencione a “sombra humana”; usa-se em sentido abstrato como a “sombra do Altíssimo”.
O significado negativo é retido em todos aqueles lugares é mencionada em conjunto com “morte”, gr. thanatos. Neste caso é o reino das trevas que ameaça a vida, referindo-se muitas vezes a natureza curta e transitória da vida humana. Na literatura apócrifa é também usado neste sentido de finitude do humano.
Gnosticismo
Evangelho de Tomé
Evangelho de Tomé – Logion 106
Nem no relato “elohista”, nem no desenvolvimento “yahvista” que segue, menciona o AT a criação em algum lugar diferente dos céus e da terra que se pode agregar a estes. No entanto, a tradição testamentária abunda em referência à existência de algum lugar, independente dos dois reinos criados, destinado a ser morada dos mortos.
O NT conhece dois nomes para estes lugares, o Hades e a Geena. Por outro lado, é sabido que a Septuaginta se serviu em quase todos os casos do vocábulo grego hades para traduzir o “seol” veterotestamentário. De igual maneira, a geena é o nome aramaico do hebreu Ge Hinon, que no AT se referem especialmente os profetas. Ainda que a identidade de nomes não é demonstrativa de identidade de significados, existem sem dúvida entre os lugares de ambos testamentos importantes coincidências que devem ser consideradas.
A etimologia mais significativa do vocábulo Hades é o “invisível”, na literatura grega serve para designar o lugar onde transcorre a existência dos mortos, os quais são descritos como “Sombras”.
Isso mesmo se pode dizer do Hades enquanto versão do “seol” hebreu, pos é o “mundo subterrâneo” que recebe aos defuntos. A denominação “mundo subterrâneo” relaciona o seol hebreu com o mundo invisível subterrâneo do antigo Egito. O mais chamativo que se pode dizer do seol, o mundo dos mortos, é que é um lugar de vivos. Por isso não é possível identificar o selo com o sepulcro terreno, visível, onde se enterram os corpos dos mortos e que é somente um lugar de mortos.
Esta distinção é muito importante, pois por ela é possível esclarecer que as Sombras que vivem no seol são os defuntos que abandonaram seu corpo na raiz de sua morte corporal. O corpo morto é depositado no sepulcro e a “sombra”, viva, invisível, — ainda que às vezes leve e fugazmente perceptível em circunstâncias especiais — via viver no seol uma vida individual e diferenciada.
Acerca deste viver diferenciado há documentação testamentária. Dos homens de Coré se diz: “Baixaram vivos ao seol com tudo o que tinham” (Nm 16,33), e dos heróis do Egito: “O chamam (a YHWH) em meio ao seol os mais esclarecidos heróis” (Ez 32, 20-21), Além do mais, os vivos do seol conservam sua capacidade de consciência, pois podem reconhecer o lugar onde se encontram: “Me lançastes no profundo da fossa” (Sl 88,6). Também podem lamentar-se: “Só por ele se lamenta sua alma” (Jó 14,22), ou incluso implorar: “Quem livrará sua alma da garra do seol?” (Sl 89,49).
Posto que estão vivos os mortos que “baixam” ao seol — e isto é o que se pode deduzir dos textos — não há dúvida que estes vivos, só são mortos quanto ao corpo hílico que está depositado no sepulcro, pelo que se pode dizer que o que permanece com vida é sua consciência, qualquer que seja a denominação, ainda que privada de seu corpo material. Tal consciência é (segundo traduz a Septuaginta, o “sopro”), a alma, que habita nesse lugar o estado de mortos viventes chamado seol.
Por essa particularidade de ser almas “sem” corpo, invisíveis para o olhar dos olhos terrenos, mas visíveis às vezes, com visibilidade tênue, os habitantes do seol são designados em ocasiões como “Sobras”, tal como os habitantes do Hades grego. É certo que “sombras” não quer dizer invisíveis, senão somente que são uma réplica sutilmente visível da forma corporal visível que foi abandonada.
Também sabemos que o seol tinha, pelo menos, duas categorias de Sombras, os “refaim”, ou fantasmas, e os “elohim”, ou espectros de defuntos superiores próximos a ser deuses. Exemplos de “refaim” são aqueles habitantes dos seol nomeados no Livro de Jós: “As Sombras (refaim) tremem sob a terra” (Jó 26,5), e exemplo de “elohim” é o espectro de Samuel (vide (Necromancia))).
A outra particularidade que é necessário consignar é que o seol, tal como ocorre com o Hades grego ou com o Hades neotestamentário, não é um estado ou lugar de duração eterna, senão limitada. Algo que aparenta com o Purgatório cristão posterior.
Este fato de ser o seol o reino onde os defuntos habitam só transitoriamente, foi negado pela exegese histórica e não foram poucas as consequências que esta opinião ocasionou à doutrina cristã manifesta. É certo que o segredo que rodeou sempre as concepções veterotestamentárias desta ordem propiciou que os “doutores” se pronunciassem sempre segundo sua própria opinião e não de acordo com um conhecimento sempre difícil de cimentar.
O segredo a respeito do seol é, com efeito, muito fechado, e somente em alguns textos testamentários próximos, ou já pertencentes ao judaísmo tardio se revela a não permanência das almas no seol. Como exemplo, pode contar-se o Salmo 49: (As almas), diz, são pastoreadas pela Morte e levadas como ovelhas a residir no seol. Mas Deus — explica o salmista — resgatará minha alma; das garras do seol ME recuperará.
A evocação das ovelhas moradoras provisoriamente no seol, e que para os olhos dos homens são invisíveis, ou às vezes, tão tênues como sombras, era, como é bem sabido, um ato qualificado de necromancia que achava proibido — e não sem razão — na Lei.
Mas a mesma Lei que proibia evocar às almas do seol, serve para confirmar que desde os tempos do Levítico até Isaías, era uma crença de forte enraizamento popular em Israel que os defuntos podiam “aparecer” como Sombras, ou Espectros, quer dizer, “vestidos” com essa sutil corporeidade muito leve e diferente do corpo material que Paulo Apostolo denominaria mais tarde “corpo espiritual”, em contraposição ao corpo “natural”.
Esta comprovação permite descartar por infundada a hipótese manifesta, de que o povo judeu não conhecia a ideia de um sopro, alma ou Eu real, independente e com capacidade de vida autônoma depois de sua separação do corpo morto.