A gnose de Newton precedera sua ciência (Abellio)

(Abellio, Serant1955)

Se decompormos a célebre intuição a partir da qual Newton começou a refletir sobre a gravitação universal — “A maçã que cai na terra está para a terra assim como a terra que gravita no universo está para o universo” — notamos bem que, enquanto a ciência não tiver reduzido quantitativamente estes fatos a um conjunto de medições, a evidência desta intuição ou analogia não será necessariamente adequada. Quando digo “Penso”, isto é uma evidência, mas posso pensar falsamente. Graças a medições e cálculos, Newton chegou a “demonstrar” a lei da gravitação e, em primeira aproximação, confirma-se assim que a ciência procede por redução e a gnose por integração.

A gnose de Newton, aliás, precedera sua ciência (a intuição iluminativa de Newton foi um produto de sua gnose já encarnada), mas pode-se dizer também que ela lhe sucedeu (Newton, tendo compreendido e demonstrado a gravitação, tornou-se capaz de novas intuições mais “universais” que antes). Tentemos reconstituir esta passagem. Ela nos esclarecerá sobre a estrutura oculta por trás da “simultaneidade” gnóstica e da percepção intuitiva das analogias.

A instantaneidade da intuição de Newton, que lhe confere sua força iluminativa e que fez desta intuição um único “momento” na vida de Newton, pode de fato ser decomposta retrospectivamente por uma análise de suas implicações, e esta análise constituirá no fundo o protótipo das reconstituições fenomenológicas que podem servir de base a uma metafísica ou esoterismo regenerados.

A intuição de Newton foi como um relâmpago nas trevas interiores. No entanto, ao examiná-la bem, as três relações de que falamos se destacam com perfeita nitidez. Newton viu “primeiro” cair a maçã. Sua visão ingênua considerou este fato banal, donde emergia uma relação entre o fruto que caía e a terra que o acolhia. Ele viu “em seguida” — e foi para ele ao mesmo tempo — uma segunda relação, a da terra e do universo. Mas é aqui que a reconstituição esclarece tudo: de fato, contentando-se aqui também com a visão banal, Newton deveria ter visto o universo movendo-se em torno da terra imóvel. E, de fato, a revolução copernicana, que inverteu esta relação, foi uma visão transcendental, e não uma visão ingênua.

A intuição de Newton consistiu exatamente nisto: ao aproximar as duas relações que o senso comum lhe fornecia — a maçã se movendo em relação à terra e o universo se movendo também -, esta segunda relação lhe apareceu como um escândalo em relação à primeira: num mundo homogêneo, é o pequeno que deve se mover em relação ao grande, e não o inverso. A intuição de Newton, despertada por este escândalo, consistiu em fazê-lo cessar e restabelecer no sentido correto — que é o contrário do senso comum — a relação da terra com o universo: ela foi o produto da integração, em Newton, das aquisições da revolução copernicana.

Esta intuição aparece portanto, em sua fase última, durante a proporção entre as duas relações, como uma inversão transcendental da própria inversão natural, uma inversão da inversão. Mas ela aparece sobretudo como o confronto, no próprio Newton, do antigo Eu ingênuo da banalidade cotidiana e do “Eu” transcendental da visão transfigurada, a passagem de um a outro, e isso por uma inversão, um retorno sobre si do olhar ingênuo que o Eu punha inicialmente sobre o mundo.

É este retorno sobre si do olhar que constitui o fato capital de nossa análise. Ele nasce do “escândalo” do mundo. Daí a importância do escândalo: é preciso que o escândalo aconteça, nada nasce senão pelo jogo da contradição. Este retorno sobre si do olhar está implicitamente presente em toda descoberta ou invenção científica. Mas, ao contrário da ciência, a gnose, a fenomenologia moderna e o esoterismo o querem não mais implícito, mas explícito.

Assim, enquanto a ciência busca perpetuamente se ultrapassar abrindo novas linearidades, novas sucessões causais onde, sem o saber, ela aliena este retorno, a gnose, renunciando aos encadeamentos causalistas, fecha sobre si mesmos estes encadeamentos, vê em todo efeito a causa de sua causa, e destrói enfim em sua concepção dialética da interação universal a noção do tempo sucessivo.

 

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