LINGUAGEM — ALFABETO
Se recuamos no tempo e no espaço, constatamos que um grande número das centenas de línguas faladas entre os homens, jamais foram escritas — mesmo se, em nossos dias, muitas dentre elas sofreram, finalmente, uma alfabetização todavia alógena ao desenvolvimento cultural «interno» daqueles que as falam. A escritura não é portanto «natural»: é um fato de civilização, e é originariamente o fato de um número muito reduzido de civilizações. Eis porque, apesar do prodigioso disparate de suas formas, todas as escrituras contemporâneas se resumem de fato a dois ou três modelos, e talvez ainda menos: posta aparte a ideografia chinesa, única de sua espécie, as escrituras silábicas, da Índia e de seus arredores, remontam à única brâmane, três ou quatro séculos antes de nossa era; e todas aquelas de tipo alfabético, no universo inteiro, são derivadas, diretamente ou não, do primeiro alfabeto, estabelecido pelos «Fenícios»., eis aí passados trinta e cinco séculos. Antes deste alfabeto, as únicas civilizações conhecidas que praticaram a escritura se inspiraram, elas também, cada uma a sua maneira e sem seu tempo — o Egito Antigo a partir do início do terceiro milênio; a Índia (sistema indecifrado arcaico), quatro ou cinco séculos mais tarde; a China entre -2000 e -1500; a Ásia Menor (hieróglifos «hititas») pouco depois de -1500 do protótipo mesopotâmio. É com efeito na parte inferior do que é hoje o Iraque, entre Bagdá e Bassora, por volta de -3000, que apareceu, pela primeira vez no mundo um procedimento calculado para exteriorizar e fixar tudo o que a linguagem pode exprimir do pensamento humano. A escritura é assim um fato da civilização mesopotâmica antiga. Jean Bottèro