Boehme diz que a natureza humana, como microcosmo, contém as “assinaturas” de todas as coisas. A verdadeira assinatura de uma coisa é sua forma criada, que reside em sua natureza interior. Quando uma pessoa realmente conhece essa coisa, por meio de sua comunidade de natureza com ela, então sua essência faz com que as qualidades correspondentes nela ressoem, formando uma assinatura secundária dela nela. Então, traz sua essência à plena expressão ao falar seu nome. As outras criaturas encontram a realização de seu significado e a expressão perfeita de suas naturezas por meio da consciência e da fala humanas.
Por um lado, o papel da humanidade como reveladora das assinaturas a torna o veículo do discurso de Deus para o mundo, seu agente no cumprimento dos propósitos das outras criaturas. Portanto, Boehme correlaciona a fala humana com a própria Palavra divina criativa. A essência de uma coisa é uma forma expressa da Palavra divina. Quando Adão nomeia os animais, traz esses aspectos da Palavra para a expressão plena na fala humana e, assim, desempenha um papel na conclusão da criação.
Por outro lado, a natureza humana é o local da resposta do mundo a Deus, o espelho que as criaturas precisam para sua própria autorrealização. O fato de Adão ter nomeado as criaturas também implica que conhecia seus “nomes verdadeiros”, ou seja, conhecia e nomeava suas naturezas internas, com uma correspondência perfeita entre nome, som e essência. Essa é a teoria de uma “linguagem natural”, que mais tarde foi perdida pela humanidade decaída.
Boehme acredita que há uma relação natural entre a essência de uma coisa, seu nome e os fatores fisiológicos e auditivos ao falar e ouvir o nome. Quando o nome é compreendido corretamente, aquele que pensa, fala e ouve tem acesso à essência interna da coisa. Todas as pessoas já falaram essa linguagem única (Natursprache) que revela a verdade das coisas. Mas desde que perdemos esse poder (cf. a multiplicação de idiomas na história da Torre de Babel), nossas palavras aparecem para nós, em grande parte, como designações convencionais para as coisas. Cada povo desenvolveu sua própria vida e idioma paroquiais, de modo que cada idioma existente agora preserva apenas um resquício da Natursprache. Toda língua mantém, em sua forma falada, certas afinidades com a Natursprache, mas esses vestígios estão tão enredados na perspectiva limitada daqueles que falam a língua que os poderes comuns não são suficientes para revelá-los.
Somente uma pessoa com dons espirituais extraordinários, como o próprio Boehme, pode desvendar os segredos de sua língua nativa e, por meio da exegese de palavras e sílabas, descobrir as assinaturas do mundo que ela expressa. Essa percepção dá a Boehme uma técnica exegética para lidar com as Escrituras. A pessoa inspirada transcende o significado convencional do texto para apreender os níveis mais profundos da verdade que ele contém. Faz isso por meio de uma análise “literal”, na qual as palavras-chave, com suas sílabas e letras individuais, revelam o significado espiritual da revelação de Deus, que é inacessível ao não regenerado e aos teólogos partidários.
Somos únicos entre as criaturas, pois somente nós podemos nos expressar por meio da fala. Todas as outras criaturas dependem de nós para a plenitude de sua autorrealização. Podem emitir vários sons, que são apropriados para suas naturezas, mas somente nós podemos dizer seus nomes. A capacidade da humanidade de “falar em nome” da criação é o sinal decisivo de que ela é a imagem de Deus. A fala é o meio pelo qual o cosmo decaído deve ser reunido e redirecionado para Deus.