Capacidade da estrutura absoluta de orientar (Abellio)

(Abellio, Serant1955)

Em seu livro “A Alma e a Ação”, Charles Baudouin quase toca o fundo quando distingue dois simbolismos dialeticamente ligados, um agindo no plano funcional dos verbos, outro no plano orgânico dos nomes e objetos, e é fácil constatar que um sistema simbólico de verbos não faz senão induzir essências no sentido husserliano e inscreve-se empiricamente no sentido da redução eidética mais geral.

As diferentes psicanálises e a astrologia estrutural estão hoje tomadas por este movimento. O doutor Otto Rank, por exemplo, analisa o “trauma do nascimento” ao mesmo tempo na angústia infantil, na satisfação sexual, na reprodução neurótica, na adaptação simbólica, na compensação heroica, na sublimação religiosa, na idealização artística e na especulação filosófica. O mínimo que se pode dizer é que este conjunto justaposto de aproximações é linear. Corresponde a um simples recenseamento que espera uma organização genética.

Admitamos o trauma como um fato agindo em todos os níveis: mas como é comandada sua postura em situação nestes mesmos “níveis”? Por que este “conteúdo” comum emerge sob formas tão variadas? A redução da cadeia analógica está por fazer. O mesmo ocorre em astrologia quando nos dizem que a tendência a acumular, própria da oralidade saturniana, pode entrar tanto na possessividade do ciumento quanto na avareza, ou ainda na habilidade do naturalista ou na avidez de conhecimento do sábio.

Num dos futuros livros da coleção, André Barbault assinala que o aglomerado de quatro ou cinco planetas em Áries caracteriza os temas de personagens tão dessemelhantes quanto Hobbes, Zola, Lênin, Goya e Landru. Todos estes personagens se assemelham no entanto nisto: são marcianos quase puros, todos igualmente agressivos em sua esfera de ação. Hobbes defende uma filosofia agressiva auto-castradora; seu utilitarismo desemboca no despotismo. A pintura de Goya se compraz na selvageria e no horror. Os romances de Zola são a descrição de uma verdade crua, brutal e militante. O dinamismo revolucionário de Lênin foi o de um conquistador extremista. Enfim, Landru leva o sadismo de Áries até a perversão e o assassinato.

Ao permanecer no plano dos efeitos, a astrologia não cumpre assim senão metade de sua missão de investigação, sendo incapaz de correlacionar o aspecto astral e a situação concreta real. Para que o fato seja circunscrito, seria preciso que o aspecto astral fosse ele mesmo posto em relação com outros aspectos, significando por exemplo a vocação filosófica, ou o impulso ao assassinato. Mas no limite perder-se-ia então numa multidão infinita de relações. Para permanecer manejável, a astrologia é portanto conduzida a se limitar a um certo número de estruturas simples e polivalentes, das quais objetiva o sentido — por exemplo uma estrutura Lua-Vênus-Saturno-Netuno para a introversão, Sol-Marte-Júpiter-Urano para a extroversão -, mas esta redução a estruturas parciais marca evidentemente o limite da astrologia “objetiva”.

É preciso então colocar estas estruturas parciais em movimento rumo à estrutura global, mas isto não é mais da alçada da astrologia. É aqui que o astrólogo se põe em causa a si mesmo em seu poder mais ou menos integrador de apagar os fatos ou situações particulares por trás da universalidade de suas essências, e enfim de apagar as próprias essências. A astrologia não é mais então senão o suporte da ascese intelectual do astrólogo. Não há mais problemática própria à astrologia, assim como não há, num domínio vizinho, problemática própria à psicanálise: há uma problemática do astrólogo e do psicanalista, o que é fundamentalmente diferente.

Assim, esta capacidade da estrutura absoluta de orientar, enriquecer, intensificar o conhecimento simbolista não significa de modo algum que este mesmo conhecimento se encontre por isso legitimado enquanto ciência objetivável. O movimento rumo à objetividade perde-se indefinidamente no poder inefável do “Eu”.

 

 

Páginas em