Contos Grimm

Estórias – Contos dos Irmãos Grimm

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Com seu irmão Wilhelm, o linguista e escritor Jacob Grimm, fundador da filologia alemã, dedicou-se a recolher contos populares de regiões de língua alemã. Publicada em dois volumes, em 1812 e 1815, a coletânea Contos da infância e do lar trazia piadas, lendas, fábulas, anedotas e narrativas tradicionais de toda sorte. Além, é claro, dos contos de fadas que associamos aos irmãos Grimm – como A Bela Adormecida, Branca de Neve, Chapeuzinho Vermelho, Rapunzel e João e Maria. De início, o projeto dos irmãos era erudito: queriam preservar impressa a cultura oral “pura” do povo alemão, ameaçada pela urbanização e industrialização. Mas, ao longo dos anos e das várias edições que a compilação teve, o público-alvo foi mudando: a edição compacta, publicada em 1825, reunindo apenas cinquenta das histórias, já era voltada para as crianças, e tinha cunho educativo. [Ana Maria Machado]

Philip Pullman: Grimm Tales for Young and Old

Para a maioria dos leitores e escritores ocidentais dos últimos duzentos anos, o Kinder- und Hausmärchen (Contos para crianças e famílias) dos irmãos Grimm é fonte e origem do conto de fadas ocidental, a coleção maior e mais amplamente distribuída por um imenso número de idiomas, morada de tudo o que sentimos ser único nesse tipo de história.

Mas, se os irmãos Grimm não tivessem coletado todas essas histórias, sem dúvida alguém mais o faria. De fato, outros já realizavam algo semelhante. O começo do século XIX foi uma época de grande animação intelectual na Alemanha, uma época em que pensadores das áreas de direito, história e língua estavam examinando e argumentando o que significava ser alemão, quando na verdade não existia Alemanha enquanto tal, mas sim trezentos e tantos estados independentes — reinos, principados, grão-ducados, ducados, landgraviatos, margraviatos, eleitorados, bispados e assim por diante, o detrito fragmentado do Sacro Império Romano.

Os fatos da vida dos irmãos Grimm não são notáveis. Jacob (1785-1863) e Wilhelm (1786-1859) eram os filhos sobreviventes mais velhos de Philipp Wilhelm Grimm, um próspero advogado de Hanau, no principado de Hesse, e de sua esposa Dorothea. Receberam educação clássica e foram criados dentro dos preceitos da Igreja Calvinista Reformada. Inteligentes, empenhados e sérios, planejavam seguir a carreira legal do pai, na qual, sem dúvida, teriam se distinguido; mas sua morte súbita em 1796 fez com que a família, então com seis filhos, tivesse de depender dos parentes da mãe. A tia deles, Henriette Zimmer, dama de companhia na corte do príncipe em Kassel, ajudou Jacob e Wilhelm a serem aceitos no Lyzeum ou escola secundária, onde ambos se formaram em primeiro lugar de suas respectivas classes. Mas havia pouco dinheiro e enquanto frequentavam a Universidade de Marburg tiveram de viver muito frugalmente.

Em Marburg, ficaram sob a influência do professor Friedrich Carl von Savigny, cuja ideia de que a lei nascia naturalmente da língua e da história de um povo e não devia ser aplicada arbitrariamente de cima para baixo levou os Grimm aos estudos de filologia. Por intermédio de Von Savigny e de sua esposa Kunigunde Brentano, eles também entraram em contato com o círculo do irmão dela, Clemens Brentano, e de Achim von Arnim, que se casara com a outra irmã de Brentano, a escritora Bettina. Uma das preocupações desse grupo era o folclore alemão. Seu entusiasmo pelo assunto resultou na obra de Arnim e Brentano Des Knaben Wunderhorn (A flauta mágica da juventude), uma coleção de canções e poemas folclóricos para crianças, cujo primeiro volume foi lançado em 1805 e fez sucesso imediato.

Os irmãos Grimm se sentiram naturalmente interessados por isso, mas não sem uma dose de crítica: numa carta a Wilhelm de maio de 1809, Jacob escreveu que não concordava com a maneira como Brentano e Von Arnim haviam tratado o material do livro, cortando, acrescentando, modernizando, reescrevendo como bem entendiam. Mais tarde, os Grimm (Wilhelm em particular) seriam criticados por fazer exatamente a mesma coisa no tratamento do material base de seu Kinder- und Hausmärchen.

De qualquer forma, a decisão dos irmãos Grimm de coletar e publicar contos de fadas não foi um fenômeno isolado, mas parte de uma preocupação difundida na época.

As fontes com que eles contavam eram tanto orais quanto literárias. Algo que não faziam era percorrer a zona rural em busca de camponeses em seus chalés para anotar suas histórias palavra por palavra. Alguns de seus contos foram tirados diretamente de fontes literárias; dois dos melhores, “O pescador e sua mulher” (p. 108) e “O junípero” (p. 198), lhes foram enviados em forma escrita pelo pintor Philipp Otto Runge e reproduzidas pelos Grimm no dialeto do baixo alemão em que Runge as escreveu. Grande parte do resto veio em forma oral, de pessoas de vários níveis da classe média, inclusive amigos de família, uma das quais, Dortchen Wild, filha de um farmacêutico, acabou se casando com Wilhelm Grimm. Depois de duzentos anos, é impossível dizer até que ponto suas transcrições são exatas, mas o mesmo é verdadeiro para qualquer coletânea de contos e canções folclóricas antes da era do gravador de fita. O que interessa é o vigor e o entusiasmo das versões que eles publicaram.

Os irmãos Grimm continuaram fazendo grandes e duradouras contribuições à filologia. A Lei de Grimm, formulada por Jacob, descreve certas alterações sonoras na história da língua alemã; e juntos os irmãos trabalharam no primeiro grande dicionário alemão. Em 1837, ocorreu o que provavelmente foi o incidente mais dramático da vida deles; ao lado de cinco colegas da universidade, eles se recusaram a prestar juramento de fidelidade ao novo rei de Hanover, Ernst August, porque ele havia ilegalmente dissolvido a constituição. Como resultado, foram demitidos de seus postos universitários e tiveram de trabalhar ocasionalmente na Universidade de Berlim.

Mas é sobretudo pelo Kinder- und Hausmärchen que o nome deles é lembrado. A primeira edição desse livro é de 1812, e a coleção teve seis edições posteriores (Wilhelm, a essa altura, fazia a maior parte do trabalho editorial) até a sétima e última, em 1857, quando a obra era imensamente popular. Só As mil e uma noites rivalizam com sua significação: as duas são as mais importantes e influentes coletâneas de contos folclóricos jamais publicadas. A coleção não só ficou maior, como os próprios contos mudaram à medida que passava o século XIX, tornando-se, nas mãos de Wilhelm, um pouco mais longos, em alguns casos mais elaborados, às vezes mais pudicos, certamente mais piedosos, do que eram no começo.

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