Havia um grande mestre de Ch’an, chamado Si-yun em religião, que vivia no sopé do Pico dos Abutres, no Monte Houang-po, perto de Kao-an, na província de Hong1.
Descendente direto do Sexto Patriarca de Ts’ao-si, filho espiritual de Pai-tchang e “sobrinho” de Si-t’ang, ele era o único detentor, além de qualquer texto canônico, do selo do veículo supremo2, fui designado para Tchong-ling, onde convidei o mestre. Ele deixou sua montanha e veio para o monastério de Long-sing. Lá, o questionava de manhã à noite sobre o Caminho.
No segundo ano da era Ta-tchong (848), fui designado para Wan-ling. Mais uma vez, fui até o mestre para prestar-lhe homenagem e pedir-lhe que honrasse a sede de minha administração com sua presença. Ele foi até o monastério K’ai-yuan onde, durante todo o dia, ensinou-me seu método espiritual. Quando partiu, escrevi seus ensinamentos em uma dúzia de pontos, mas não ousei mostrar a todos o selo espiritual que ele havia me confiado.
Hoje, no entanto, temendo que o que havia entendido desaparecesse, peguei minhas anotações novamente e as entreguei aos discípulos T’ai-tcheou e Fa-tsien para que as levassem ao monastério Kouang-t’ang em nossa antiga montanha e perguntassem aos anciãos se o significado delas correspondia ao que haviam ouvido muitas vezes no passado.
Escrito no oitavo dia da décima lua do décimo primeiro ano da era Ta-tchong (857) do grande T’ang.
Um “mestre de Ch’an” é originalmente um especialista em concentração meditativa (tch’an, dhyâna), em oposição aos mestres de métodos (fa-che) ou mestres de disciplina (liu-che). Posteriormente, essa expressão passou a designar os mestres da escola Tch’an.
O Pico dos Abutres (kieou-fong, grdhrakuta) é, acima de tudo, a montanha próxima a Râjagrha, em Magadha, onde o Buda ensinou Prajftāpāramitā.
O Monte Houang-po ficava a oeste da atual Fou-ts’ing, em Fou-kien. Quando Houang-po se estabeleceu em Kiang-si, ele rebatizou com esse nome a montanha onde estava localizado seu monastério Kouang-t’ang. Cf. C 1 a.
A prefeitura de Hong (Hong-tcheou), também chamada de Tchong-ling, corresponde à atual cidade de Nan-tch’ang em Kiang-si.
Kao-an é uma pequena cidade a sudoeste de Nan-tch’ang, na margem norte do rio Tsin-kiang ↩O Sexto Patriarca de Ts’ao-si não era outro senão Houei-neng (638-713). Cf. A 16.
Houai-hai de Pai-tchang (720-814), mestre espiritual de Houang-po, foi discípulo de Tao-yi chamado Ma Tsou (709-788), ele próprio discípulo de Houai-jang de Nan-yue (677-744), discípulo imediato de Houei-neng. Quanto a Che-chang de Si-t’ang (735-814), ele foi discípulo de Ma Tsou e colega de Pai-chang).A mente una era sua única transmissão e ele não tinha nenhum outro método espiritual. Essa mente também é de substância vazia e todas as situações em que pode ser encontrada são pacíficas. Como a grande roda do sol que se eleva no céu, ela jorra luz e sua pureza permanece imaculada. Aqueles que testemunham não veem nem o velho nem o novo, nem a profundidade nem a superficialidade. Aquele que a prega não a explica teoricamente, não se apresenta como o fundador de uma escola espiritual, não abre uma loja. Ela é diretamente acessível, mas ao menor reflexo, a pessoa se afasta dela, e é mais tarde que redescobre seu caráter búdico fundamental.
Portanto, suas palavras eram simples, suas razões diretas, seu caminho abrupto e sua prática solitária. Dos quatro cantos do império, discípulos se reuniram na montanha (Houang-po), despertando com a simples visão do mestre. Mil pessoas compunham esse público.
No segundo ano da era Houei-tch’ang (842)((É importante lembrar que a era Houei-tch’ang foi a da proscrição do budismo ordenada pelo imperador Wou-tsong. ↩