O ponto de partida da doutrina é a identificação da Deusa suprema, Tripurâ, e o princípio da consciência ou cittattva. […] [O princípio da consciência é de fato a essência comum da Deusa e de seus adoradores. Nestes últimos, no entanto, não está mais presente em um estado puro, desfigurado como está por todos os tipos de projeções imaginárias: objetos considerados “externos”, a imagem do corpo, funções sensoriais, ideações, etc., em suma, pelo que a escola Çankara chama de upādhi ou “condições limitantes extrínsecas” (cf. n. 57). A única adoração digna da Deusa consiste, então, em um esforço por parte do meditador para se despir sistematicamente de todas essas pseudo-afiliações contingentes e individualizantes. Por fim, o meditador deve ser capaz de entrar em coincidência com a percepção pura, ou seja, tornar-se absolutamente idêntico à própria Tripura, de acordo com o axioma vedantino de tat tvam asi –. Aqui e ali — o texto se propõe a descrever a consciência pura como uma espécie de substrato permanente, cuja continuidade ininterrupta e autoidentidade perpétua contrastam com a alternância dos estados de vigília e sono, a heterogeneidade das perspectivas individuais e a impermanência geral das experiências concretas. Típico a esse respeito é o método de classificação que a Princesa Hemalekha sugere ao seu marido, o Príncipe Hemacuda: “Tente eliminar sistematicamente tudo em você que possa ser chamado de ‘meu’. Depois, reconheça o que restar como o Ser supremo” (p. 86). Seguindo esse fio condutor, Hemacuda passa por camadas cada vez mais profundas de experiência — embora ainda constituídas de “experiências” particulares — até se fundir (ou acreditar que se funde) na consciência absoluta. Ainda no mesmo espírito — e quase nos mesmos termos de Çankara — Hemalekha se propõe a fazer com que seu marido entenda o quão absurdo é pretender demonstrar a existência (ou inexistência) da consciência pura, porque sua presença já é pressuposta em qualquer implantação dos meios de conhecimento, “porque é a alma de qualquer demonstração”.
Hulin (DSDT:17-18) – princípio de consciência
TERMOS CHAVES: consciência
Michel Hulin (1936), Xivaísmo de Caxemira
- Hulin (DSDT:117-121) – a vida é um sonho
- Hulin (DSDT:125-130) – a significação de “fora de”
- Hulin (DSDT:15) – A doutrina secreta da deusa Tripura
- Hulin (DSDT:175-177) – o conhecimento liberador
- Hulin (DSDT:59-66) – a condição permanente do Si-mesmo
- Hulin (DSDT:78-80): o Senhor
- Hulin (DSDT:83) – a chave de uma alegoria
- Hulin (PEPIC:132) – o mundo
- Hulin (PEPIC:19-23) – O Atman nos Upanishads