A expressão EU SOU (ego eimi) é típica do Jesus joânico. Trata-se duma expressão de revelação em que o sujeito — Jesus — se autoproclama como AQUELE QUE É, referindo-se a ele mesmo, sem predicado, ou com predicado:”Eu sou o pão da vida” (6, 35. 48); “Eu sou o pão que desceu do céu” (6,41); 6,51:”Eu sou o pão vivo”; 8,12.”Eu sou a luz do mundo”; 8, 23:”Eu sou do Alto”; 8, 24″…De fato, se não crerdes que Eu sou o que sou, morrereis nos vossos pecados”; 8, 28: “Então ficareis a saber que Eu sou o que sou…”; 10,7:”Eu sou a porta das ovelhas”; 10, 1 l:”Eu sou o bom pastor”; 10,30:”Eu e o Pai somos um”; 11, 25:”Eu sou a ressurreição e a vida”; 14, 6: “Eu sou o caminho e a verdade e a vida”; 15, l:”Eu sou a videira verdadeira”;”18, 5, 6.8:”Sou Eu”.
No AT é o próprio Deus (YHWH) que se manifesta como o EU SOU. A expressão de Ex 3, 14 significa EU SOU O QUE SOU. Na tradução dos LXX (ego eimi ho ôn) significa EU SOU AQUELE QUE É. A tradução grega sublinha a essência do ser de Deus ou a sua natureza única: Deus é.
Em João, o EU SOU na boca de Jesus revela também o seu ser e natureza divinas.Jesus não diz EU SOU YHWH, mas revela o seu ser divino. E bem elucidativa a declaração de 8,24:”De fato, se não crerdes que EU SOU O QUE SOU, morrereis nos vossos pecados.” Jesus tem a vida em si mesmo (5, 26), como tem o poder de “oferecer a sua vida e de a retomar” (10,17-18).Tem o poder de dar a vida escatológica aos que guardam a sua palavra (8, 51: “Em verdade, em verdade vos digo: se alguém observar a minha palavra, nunca morrerá”, 17, 2:”… a fim de que dê a vida eterna a todos os que lhe entregaste”). E sintomática a afirmação de 8, 58: “Antes que Abraão fosse, Eu sou”. O presente do indicativo significa que a essência do ser de Jesus é o próprio SER. O contraste entre o verbo genesthai (vir à existência), aplicado a Abraão, e o presente do indicativo de eimi, aplicado a Jesus, já diz tudo. E é interessante a maneira como os judeus reagem a esta afirmação: “Então, agarraram em pedras para lhe atirarem.” Significa que Jesus tinha proferido uma blasfêmia, e que, por isso mesmo, devia morrer. O predicado VIDA ETERNA, que Jesus, juntamente com o Pai, oferece e dá a quem nele acredita, só pode significar o seu poder divino: 3,16.36; 4,14.53; 5, 21-26,6,33.35.44.51-58.68; 8,12; 10,10.17-18; 11,25; 14,6; 17,2-3. Ora, segundo a ortodoxia judaica, só Deus é eterno e só ele pode dar a vida eterna; logo, a ação de Jesus, confundindo-se com a do próprio Deus, seria, naturalmente, para os judeus, uma blasfêmia. (ESJ)