Escritor e filósofo alemão. Cursou seus estudos nas Universidades de Bonn e Leipzig, onde se especializou em filologia clássica, entusiasmando-se com a filosofia de Schopenhauer e a música de Wagner. Em 1870 foi nomeado professor de filologia clássica em Basileia, atividade que deixou em 1878 por grave enfermidade. O restante de seus dias esteve em Sils Maria, na Riviera, e em diversas cidades da Itália e da Alemanha, quase sempre solitário e rodeado, às vezes, de seus escassos amigos e discípulos. Na última década de sua vida foi vítima de um obscurecimento mental e paralisia, fruto de uma depressão nervosa que vinha sofrendo há muitos anos.

No pensamento e atividade de Nietzsche costumam distinguir-se três períodos. O primeiro — que vai desde seus estudos até 1878 — caracteriza-se por seus primeiros trabalhos de interpretação e crítica da cultura do Ocidente e do cristianismo, e pela exaltação e devoção que sente por Schopenhauer e Wagner. Deste período são as suas obras: A origem da tragédia (1872); A filosofia na época trágica dos gregos (1874) e Considerações intempestivas (1875-1876). No segundo — a partir da ruptura com Wagner (1878) — manifesta sua exaltação pela cultura e espírito livres. Está representado por obras como Humano, demasiado humano (1876-1880); Aurora (1881); .4 gaia ciência (1882). Finalmente, o terceiro, chamado período de Zaratustra ou da vontade de poder, com obras como Assim falou Zaratustra (1883); Para além do bem e do mal (1889); Genealogia da moral (1887). A essas seguiram-lhe outras bem conhecidas como O anticristo; O imoralista; A vontade de poder; Ensaio de uma transmutação de todos os valores; O niilismo europeu; Os princípios de uma nova escala de valores, e os aforismos definitivos sobre o Eterno retorno.

Apesar desses períodos de seus contrastes e contradições, os críticos encontraram em Nietzsche uma unidade de pensamento em toda a sua obra. Reduzida a um esquema, poderia ser o seguinte: a) A distinção entre o apolíneo e o dionisíaco na cultura grega e em toda a cultura ocidental leva-o a uma exaltação de Dionísio como “afirmação religiosa da vida total, não renegada nem fragmentada”. É a exaltação do mundo tal como ele é, sem diminuição, sem exceção e sem eleição: exaltação infinita da vida infinita, b) A inversão dos valores — na qual Nietzsche via a sua missão e o seu destino — aparece em sua obra como uma crítica da moral cristã, reduzida por ele substancialmente à moral da renúncia e do ascetismo. A moral cristã é a rebelião dos inferiores, das classes subjugadas e escravas, contra a casta superior e aristocrática. Seu verdadeiro fundamento é o ressentimento: o ressentimento daqueles a quem é proibida a verdadeira reação da ação, e que encontram sua compensação numa vingança imaginária, c) Os fundamentos da moral cristã: o desinteresse, a abnegação, o sacrifício são o fruto do ressentimento do homem fraco diante da vida. d) O tipo ideal da moral corrente, o homem bom, existe somente às custas de uma fundamental mentira: negar a realidade, tal como está feita. O último resultado é negar a vida, não aceitá-la. e) Como contraposição, Nietzsche exalta tudo o que é terreno, corpóreo, anti-espiritual, irracional. “Eu ensino aos homens uma vontade nova: seguir voluntariamente o caminho que os homens seguiram cegamente, aprovar esse caminho e não tentar refugiar-se como os doentes e decrépitos” (Assim falou Zaratustra). Tal é a vontade de viver ou de poder: porque a vida é o valor supremo.

Para a conquista da vida e do mundo, Nietzsche propõe o eterno retorno e o super-homem. Porque o “eterno retorno” nada mais é do que o sim que o mundo diz a si próprio, é a auto-aceitação do mundo, a vontade cósmica de reafirmar-se e de ser ela mesma: expressão cósmica daquele espírito dionisíaco que exalta e bendiz a vida. “Esse mundo tem em si uma necessidade, que é sua vontade de reafirmar-se e, por isso, voltar eternamente sobre si mesmo.”

E se a fórmula do “eterno retorno” é a fórmula central, cósmica, do filosofar de Nietzsche, a do super-homem é a sua palavra final. “O homem deve ser superado — diz Zaratustra — . O super-homem é o sentido e o fim da terra. É a expressão e encarnação da vontade de poder. Portanto, o homem deve ser superado.” O que significa que todos os valores da moral corrente — que é moral gregária — devem ser transmudados. Para conseguir esse super-homem, deve-se renunciar aos valores constitutivos da cultura ocidental: a filosofia, a metafísica e a ética platônicas, juntamente com a contribuição judaico-cristã a ela.

Nietzsche propõe um niilismo absoluto e total para a consecução do super-homem. Consiste em fazer tabula RASA de todo pensamento filosófico grego e cristão. O super-homem exige a morte de Deus, do Deus dos metafísicos, do Deus monoteísta, do Deus moral das contraposições metafísicas entre o bem e o mal, mundo real e mundo aparente. Somente assim será possível a liberdade, característica do super-homem. Somente assim se construirá uma vida e uma moral acima e além do bem e do mal.

Dificilmente se pode dizer, em poucas palavras, o que significou e ainda significa Nietzsche para o cristianismo. Filósofo da “suspeita”, assim como Marx e Freud, “criou uma filosofia onde não há um acontecer objetivo, uma garantia estável, onde Deus morreu e onde o homem só pode existir como super-homem”. Nietzsche quis realizar o infinito para o homem e no homem. Transmudou os valores eternos pelos do mundo.

BIBLIOGRAFIA: Obras em português: O Anticristo; Crepúsculo dos ídolos; A genealogia da moral; A origem da tragédia; Assim falava Zaratustra; A minha irmã e eu; Além do bem e do mal; Ecce Homo: como cheguei a ser o que sou e outras; Eugen Fink, La filosofia de N, 1969; Gonzalo Sobejano, Nietzsche en Espana, 1967. (Santidrián