Daumal poeta, concedia uma grande importância à linguagem. Encontrou no sânscrito não somente a língua lhe permitindo chegar diretamente aos textos que tinha necessidade, mas também a língua que, por excelência, exprime da maneira mais concreta, as realidades espirituais. Não se deve duvidar que o profundo conhecimento que dela adquiriu, o ajudou fortemente a se aproximar destas realidades e a fazê-las viver nele.
Em várias ocasiões, me escreveu que considerava a língua sânscrita como o monumento principal da Índia. Deixou claro seu pensamento a este respeito em uma carta inédita a A. Rolland de Renéville, da qual extraímos a seguinte passagem:
… a grandeza própria da velha civilização indiana, é de ter desenvolvido a limites extremos a expressão pelas palavras daquilo que as palavras não podem senão concernir de longe: no domínio das palavras, os velhos hindus giram como os outros ao redor do pote, mas uma pouco mais próximo. É porque a cultura hindu levou tão longe a técnica verbal, e em uma língua que é, no fundo, a nossa, que seus documentos literários podem ser tão perigosos e tão preciosos para nós, que somos comidos pelas palavras (não digo isto levianamente: há alguns dias, vi um senhor «culto» a quem se mostravam coisas simples, mas incomuns, e como não encontrasse palavra para lhe servir de “óculos”, não viu nada mesmo: as palavras tinham tomado o lugar de seus olhos. Notastes também como uma montanha parece mais assustadora do momento que se a nomeia; e é bom fazê-lo com uma meta consciente; mas o fazemos sempre sem o saber).
A maneira que Daumal pensava que se deveria traduzir as velhas escrituras védicas é muito interessante. Ele a explicava em uma nota que acompanha seu esboço de tradução da Mandala XI do Rig-Veda. Resumidamente, ele dizia que devemos nos aproximar destes textos com uma mentalidade ingênua e não aí introduzir nossas categorias mentais de homem ocidental do século XX. Ele considerava o Veda como relatos de crianças mas de crianças salvas, espontaneamente iluminadas; nas quais a Memória falava pela primeira vez. Portanto, é preciso traduzir o mais simplesmente possível e não perdendo jamais de vista que estes escritos não demonstram um conhecimento intelectual.
Depois do estudo da língua sânscrita (que contou com a ajuda de Philippe Lavastine) abordou sua retórica e aí também fez descobertas que sacudiram todas as noções aprendidas em Aristóteles. Para todas as disciplinas, o hindu, na época clássica, se prepara longamente mesmo se não tem senão uma única palavra a proferir. É a natureza desta preparação do tom, onde se deve engajar por inteiro, que apaixonava Daumal. Ensaiou fazer compreender a seu amigo íntimo André Rolland de Renéville (v. Daumal Produção Literária – Produção Literária), em que consistia esta preparação no domínio literário, desejando utilizar as regras sânscritas para seus próprios escritos.