“Melancolia” de Dürer, segundo Cioran

Melancolia I – Wikipédia, a enciclopédia livre

(Cioran1995)

Entre todas as obras de Dürer, a gravura intitulada Melancolia é a que mais contém elementos propícios à reflexão e ao abandono que podemos experimentar ao mergulhar na atmosfera de uma obra de arte. Minha admiração não se deve a uma apreciação objetiva da forma, mas à alegria suscitada por uma criação que expressa um estado de alma em si mesmo. Aqui, o psiquismo prevalece sobre a técnica. A melancolia opera uma dualidade: separa o homem de seu entorno e da realidade em geral, intensificando a consciência da diferença essencial entre o homem e a realidade objetiva.

Nesse caso, a solidão e o sentimento de abandono têm raízes profundas, pois não resultam de condicionamentos acidentais ou fatores insignificantes — emanam da totalidade do nosso ser. Mais do que no simples tédio, é na melancolia que o homem se encontra verdadeiramente só diante da existência. A agudeza de sua intuição mostrou a Dürer que a melancolia só teria significado profundo se o olhar do homem melancólico se abrisse para uma perspectiva do infinito. Ao desenvolver excessivamente o sentimento da finitude do indivíduo, a progressão ininterrupta implícita na ideia de infinito cria um cenário propício à melancolia. O olhar perdido típico dos estados depressivos, a intuição vaga e difusa não fariam sentido em um contexto limitado, sem perspectiva. Vale lembrar que o sentimento do infinito desapareceu em grande parte nas cidades modernas, onde o homem se sente apertado, oprimido pelo espaço que já não se abre em sua grandeza natural. Em vez de viver o infinito espacial, o homem das metrópoles vive, como compensação, o infinito temporal como um devir concreto, com todas as complicações relativistas que isso implica.

A visão da melancolia em Dürer é totalmente desprovida de serenidade. Revela uma insatisfação próxima do trágico. Não é o mesmo na Renascença italiana. Lá, os estados melancólicos também têm o infinito como pano de fundo e revelam a estranha particularidade do homem no universo, mas a tensão reflexiva é atenuada por um sorriso contido e misterioso, que o homem dispersa no infinito. O dualismo não assume a forma de uma tensão dolorosa, pois os laços com a ordem cósmica ainda não foram rompidos.

É importante destacar que, na melancolia, não estamos definitivamente separados da existência. Isso é evidenciado pelo sentimento de arrependimento, sempre presente e geralmente voltado para um fato irreparável do passado. Ele reabre uma ferida cicatrizada ou atualiza um conteúdo psíquico que não podemos mais viver em seu contexto original. É doloroso nos fragmentarmos ao deixar antigos quadros de vida, onde deixamos um pouco do conteúdo do nosso ser. Mas, aqui, o divórcio com o real é, por assim dizer, retrospectivo — não indica nada sobre possibilidades futuras.

Que diferença em relação ao desespero, que nos dá uma impressão de definitivo! O sentimento de abandono absoluto, de uma suspensão torturante no universo, da presença inevitável da morte na vida, da imanência do mal nas raízes da criação, convence fortemente nossa consciência de que o irreparável está à frente, e que todas as tentativas de melhorar a condição humana estão fadadas ao fracasso. O tempo, que na melancolia é essencialmente um princípio irracional, revela no desespero seu caráter demoníaco. Em Dürer, como em geral na Renascença do Norte, a melancolia está mais próxima do desespero do que na Renascença italiana. Esta última a modera com um sentimento embrionário de graça. Mais tarde, no século XVIII, em um Reynolds ou um Gainsborough, a melancolia será inseparável do charme da inutilidade que emana da graça — mas terá uma coloração demasiado feminina para conservar sua capacidade de revelar o mundo.

Ao contrário de Martin Heidegger, cremos que é a melancolia — e não o tédio — que revela ao homem o ser-em-si, pois o tédio resulta de condicionamentos fortuitos e externos. Ele é a forma vulgar da melancolia e, como tal, não pode ter uma produtividade rica; corresponde essencialmente à ausência de ocupações ou estímulos externos. Pouco importa se Dürer pensou ou não na capacidade reveladora do estado melancólico, já que os artistas objetivam vivências irracionais sem relacioná-las a um plano teórico. Além disso, há em Melancolia de Dürer um fundo religioso que nós, modernos, temos dificuldade em compreender, pois vivemos quase exclusivamente no plano da imanência.

A nostalgia que emana do olhar da figura enigmática da gravura de Dürer não expressa uma espécie de lamento religioso pelas realidades perdidas? Não revela uma aspiração à transcendência? Pois essa aspiração a realidades transcendentes estava presente em toda a Renascença, tanto no Sul quanto no Norte — embora menos intensa na Itália do que no norte da Europa, onde o cristianismo sofreu menos com o recrudescimento do paganismo. Observa-se em Dürer uma oscilação entre a intencionalidade transcendente e a imanência terrestre, oscilação que é uma das facetas de seu trágico.

A alma gótica sempre foi inquieta, nunca encontrou calma nem equilíbrio. A Renascença do Norte é apenas um episódio. O Barroco retomará a tradição gótica. No entanto, justamente por isso, a Renascença do Norte conserva um caráter de incerteza torturante, pois uma alma assumiu formas heterogêneas. Compreende-se, então, por que a melancolia é temperada pelo sorriso na Itália, enquanto no Norte da Europa é agravada por uma tensão dolorosa. Se Melancolia de Dürer carece da menor ironia (que seria uma negatividade infinita), é porque a realidade opõe ao homem uma resistência grande demais para que ele possa contrapor-lhe o sorriso de sua própria superioridade. Isso explica a inclinação da Renascença italiana pela vida e a da Renascença do Norte pela morte.

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