LINGUAGEM — METÁFORA
VIDE: Alegoria
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Orígenes
Todas as imagens e todas as figuras comparadas à realidade dos bens verdadeiros e espirituais são fracas e terra a terra. Ora o Verbo de Deus que nos exorta a imitar a oração dos santos, a fim de que peçamos em sua realidade o que eles obtêm em figura, nos lembra que os bens celeste e de importância são significados por valores terrestres e modestos. Como se dissesse: quereis ser espirituais? Peçais em vossas orações os bens do céu e de consequência, e os tendo recebidos, herdareis o Reino dos Céus: tornados grandes, desfrutareis de bens maiores. Quanto aos bens da terra e cotidianos, dos quais tendes necessidade para vossas necessidades corporais, o Pai vo-los dá em acréscimo, na medida do necessário. (Tratado da Oração)
Cabala
Adin Steinsaltz (Adin Even Yisrael)
Excertos de “A Rosa de Treze Pétalas”. Maayanot, 1992.
Assim, a Bíblia e outras criações literárias dos judeus, como a Haggadah e a cabala, estão repletos de antropomorfismos de todos os tipos, não somente com relação à deidade, mas em todo tipo de descrição. Esta humanização da realidade do mundo, tanto dos objetos e criaturas inferiores ao homem quanto dos superiores, está entre os aspectos profundamente consistentes do uso da língua sagrada. Como o expressou um dos sábios: “A alma descreve tudo de acordo com a configuração das suas mansões, que é o corpo”. Em outras palavras, o mundo é conceitualizado e seus objetos são descritos por um sistema de metáforas baseado no corpo humano. Então, a linguagem “eleva os inferiores”, por imagens como “a cabeça (topo) da montanha” e “o pé da montanha”; e ela “abaixa os superiores”, mediante descrições como o “assento” do Todo-poderoso, a “mão” de Deus, o “olho” do Senhor, e assim por diante.
Este uso das imagens e dos símbolos plásticos é tão característico da linguagem, que é difícil achar uma frase das Escrituras que não esteja construída com base na descrição metafórica, no lugar da conceitualização abstrata. Conceitos associados a imagens são achados em toda parte, em quase todos os parágrafos dos livros da lei e da jurisprudência, assim como na poesia e na literatura, e servem primariamente, e muito surpreendentemente, para descrever tudo o que pertence ao sagrado.
Precisamente devido a esta prevalência da afirmação metafórica, e ao uso muito difundido de figuras de fala extraídas da imagem humana, torna-se mais necessário ainda enfatizar que são verdades alegóricas, não descrições verdadeiras da realidade, porque havia um certo perigo de que as imagens de palavras, ou descrições por imagens, de símbolos sagrados na Bíblia — e ainda mais na Cabala — pudessem levar a uma percepção cruamente material da essência divina e da realidade superior. Daí surge a proibição contra toda representação da santidade através de meios físicos e plásticos. Acompanhando-a, e talvez originando-se nesta extrema rejeição à semelhança plástica do Divino, a tradição judaica também mantém uma certa suspeita da tendência do homem para desenhar, elaborar e retratar a si mesmo.
Filosofia
Michel Henry: Eu sou a Verdade
Ora a porta do cercado que, ao dizer da estranha parábola (Pastor e Ovelhas), dá acesso ao lugar onde pastam as ovelhas, fundando acima Ipseidade transcendental na qual cada eu, se reportando a si e se acrescendo de si, retira a possibilidade de ser um eu, esta porta, lemos, dá acesso ao conjunto dos eus transcendentais viventes — não a um só dentre eles, àquele que eu sou eu mesmo. O Cristo não se mantem só em mim como a força que, ME oprimindo contra mim, faz sem cessar de mim um eu. Cada eu não advém a ele mesmo senão desta maneira, no poder formidável deste constringir no qual ele se auto-afeta de maneira contínua. Eis porque a porta abre sobre todos os viventes. De acesso a cada um dentre eles, disto só é possível através do Cristo. E é preciso compreender o que uma tal proposição significa com todo o rigor. Se o acesso a todo eu concebível pressupõe sua vinda nele mesmo à favor de uma Ipseidade prévia que não procede dele mas da qual ele procede, então com efeito aceder a este eu quer dizer tomar emprestado a via desta vinda prévia nele nele da qual ele resulta — atravessar a porta, atravessar a parede incandescente desta Ipseidade original na qual queima o fogo da Vida. Impossível chegar até cada um, alcançá-lo, exceto através do Cristo. Através da Ipseidade original que o reporta a ele mesmo, fazendo dele um Si — este alguém, este “eu” que ele é. Impossível tocar uma carne exceto através de uma Carne original, a qual em sua Ipseidade essencial dá a esta carne de se sentir a si mesma, de se experienciar a si mesma, lhe concede ser uma carne. Impossível tocar esta carne sem tocar a outra carne que fez dela uma carne. Impossível de atingir alguém sem atingir o Cristo. E é o Cristo que o diz: «O que fazes ao mais pequenino dentre vossos irmãos, é a mim que o fazes» (Mt 25,35).
Não se trata de uma metáfora. A palavra não quer dizer: o que fazes a um de nossos irmãos, é como se ME fizésseis a mim. No cristianismo, não há metáfora, nada que seja da ordem do “como se”. E isso porque o cristianismo só tem a ver com a realidade, não a do imaginário ou a dos símbolos. Um “eu” não é como se fosse um “eu”. Este eu que eu sou não é como se fosse meu eu para mim. Neste caso poderia também ser como se fosse aquele de um outro, um outro eu. Estas derivas imaginárias pertencem às representações febris da doença, notadamente da doença da vida na qual cada um se volta contra si e não quer mais ser aquele que é, se identificando à necessidade, deste fazer, a um outro. Longe de pôr em causa o irremediável de um eu ancorado para sempre nele mesmo, as derivas imaginárias o pressupõem. Mas o eu não está ancorado nele mesmo para sempre senão pela força da Ipseidade essencial que, lhe dando a ele mesmo e o ligando a ele mesmo em seu constringir patético, fez dele este eu que ele é para sempre. Logo antes que este eu fosse, a Ipseidade original do Arque-Filho o projeto nele mesmo. Sem esta Ipseidade que o precede, nenhum eu não seria jamais. Logo eu, se eu tenho a ver a mim, eu tenho então a ver ao Cristo. E se eu tenho a ver a um outro, eu tenho então a ver nele ao Cristo. Em tudo o que eu lhe faço, eu o faço então ao Cristo. A significação destas implicações que suportam a ética cristã aparecerá mais tarde.