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Estórias – Mil e Uma Noites
Hugo Xavier
Importante para perceber o contexto será referir que na época a que se reportam as citações e autores previamente mencionados houve um grande debate intelectual que opôs as tradições literárias árabes, baseadas na poesia e nos contos, e as persas, baseadas nas fábulas. Desse debate resultou uma síntese em que vários intelectuais persas adaptaram para árabe peças literárias de tradição persa, juntando-lhes poemas da tradição árabe. É neste quadro que surge a necessidade de atribuir uma origem persa às Noites, mesmo que eventualmente essa origem tenha sido forjada, fosse como forma de enaltecer as tradições persas e de dar autoridade ao texto em questão, fosse, pelo contrário, uma forma de renegar a baixa categoria literária que lhe atribuem os vários intelectuais árabes da época que lhe faziam referência, denunciando os elementos estrangeirados e menos nobres que caracterizariam as tradições persas face às árabes. Acreditar que As Noites são a tradução de um livro persa é, em termos comparativos, tão válido quanto acreditar que o pretenso manuscrito desaparecido que Umberto Eco usou para redigir O Nome da Rosa tenha existido realmente.
Assim, tudo leva a crer que nunca terá existido um original persa; tal como, e mais importante, o livro referido como sendo uma tradução do Hazār Afsānah seria muito diferente daquele que veio a ser As Mil e Uma Noites. A única certeza que se pode ter é a de que o quadro principal com um enredo que engloba as personagens Xerazade, Dinarzade, o rei e o vizir, já existia na época. Tudo o resto é uma incógnita. [Hugo Xavier, As Mil e Uma Noites]
R. Cansinos Assens
En resumen: que aún estamos muy lejos de poder decir nada dogmático sobre el origen de Las mil y una noches y, más todavía, de poder señalar lo canónico y lo apócrifo en ellas. Solo hay cierto consenso entre los orientalistas respecto a considerar como auténticos los cuentos primeros, desde la Introducción hasta la Historia del casamiento del rey Bedr Bástim-ben-Schahramán con la hija del rey Samandal (Noches 406 a 421), que constituyen el meollo, el protoplasma del libro y deben de ser, por consiguiente, los más antiguos. Todos los demás son opinables y discutibles.
La misma incertidumbre se observa respecto a los múltiples autores que rapsódicamente han compuesto esta serie de libros.
No sabemos nada concreto acerca de ellos, pese a los trabajos de Littmann y Goester y Krimsk, cuyas historias literarias de Las mil y una noches son una colección de ingeniosas inducciones, un alarde de lo que se ha llamado «crítica conjetural».
Lo único que ha podido señalarse en la disección erudita de ese Pájaro Roj literario es la presencia, en su buche, de libros enteros persas, como el de Sendebar, o de Los siete (diez o cuarenta) visires y adherencias con otros, como el sánscrito Kathá Sárit Ságara (Mar de las corrientes de la Historia) y el bajolatino Gesta Romanorum, en que se cuentan historias idénticas o muy parecidas a las miliunanochescas. Pero también esos libros plantean problemas o, mejor dicho, enigmas eruditos.
Nos hallamos, pues, siempre en un laberinto, en un circulo vicioso—análogo al en que se debaten los investigadores del Rig Veda—o, si lo preferís, mágico. Podríamos decir que los eruditos juegan aquí al juego de las cuatro esquinas y van de lo sánscrito a lo persa y de lo persa a lo árabe y de lo árabe a lo hebraico, engañados por ecos y semblantes confusos.
Dejemos, pues, esa cuestión y completemos el cuadro de las traducciones de Las mil y una noches que se presentan con pretensiones de integras y literales. [R. Cansinos Assens: Libro de las Mil y Una Noches]
Malba Tahan
Massudi, que viveu no século XI e foi um dos escritores mais viajados do seu tempo, afirmou que As mil e uma noites foram tiradas do livro persa Hezar Afsaneh [Mil histórias]. Esta última obra, segundo se afere de uma referência que a ela faz Firduzzi, no prefácio de Schanameh [Livro dos reis], é atribuída a um poeta persa, Rasti, que teria vivido na segunda metade do século X. E, assim, o erudito Massudi parece estar com a razão, pois as duas heroínas principais das Mil e uma noites, Sherazade e Dinazade, estão com seus nomes persas nas páginas famosas de Hezar Afsaneh.
Mas os persas, de acordo com a opinião de Clemente Huart, foram colher na Índia o enredo dos principais contos que figuram no famoso Hezar Afsaneh.
O orientalista e historiador alemão Gustavo Weill (1808-1889), que foi professor de línguas orientais em Heidelberg, afirma que os contos árabes das Mil e uma noites diferem totalmente das primitivas formas indiana e persa.
A difusão extrema desses contos no espaço e no tempo — universalidade e imortalidade — decorrem de condições que merecem ser frisadas. São fundamentalmente obra de imaginação e inocência.
O QUE CONTÉM AS MIL E UMA NOITES
O verdadeiro livro das Mil e uma noites, na sua forma completa, não é obra cuja leitura possa ser aconselhada para crianças ou adolescentes. É um livro profundamente contraindicado sobre vários aspectos, pois muitos dos seus contos foram imaginados com a finalidade exclusiva de divertir adultos.
Esse livro, que a saudosa poetisa Cecília Meireles considerava glorioso, encerra em suas páginas senões bem graves: erros e anacronismos.
Quando observado numa tradução, não escoimada da parte obscena, vamos encontrar na imensa cadeia das Mil e uma noites:
contos maravilhosos e de aventuras;
contos de amor e intrigas de namorados;
romances de viagens;
aventuras de cavalaria e guerra;
lendas fantásticas cheias de crueldades;
cenas de zombaria contra judeus e cristãos;
contos do gênero policial;
anedotas brejeiras e pornográficas;
episódios fantásticos e obscenos;
lutas religiosas;
parábolas e apólogos;
fábulas;
histórias de erudição (até com problemas de Matemática).
E todos os capítulos são enriquecidos por delicados trechos poéticos nos quais transparece a beleza, a suavidade e o encantamento dos versos árabes.
FONTES DAS MIL E UMA NOITES
Em muitos livros de histórias em série os árabes foram buscar inspiração para os seus contos maravilhosos. Poderíamos citar os seguintes:
Mahabharata, poema escrito em sânscrito;
Ramayana, poema indiano de origem muito remota;
Dasa-Koundra Tcharita [Aventuras de dois adolescentes]. Livro muito popular na Índia;
Katha-Sarit-Sagara [Oceano infindável de histórias]. Contos compilados por Samodéva;
Tutinameh [Contos de um papagaio]. Pequenos apólogos que se afastam muito dos bons princípios morais;
Contos de Nang-Tantrai [Contos da jovem rendeira]. Histórias da Índia antiga escritas sob a influência da religião bramânica;
Fábulas de Kalila e Dina, que foi traduzido para o português pelo professor Ragy Basile;
Hitopadexa [Instrução útil]. Coleção de fábulas e apólogos morais da Índia. Para este livro há uma excelente tradução de monsenhor Sebastião Salgado.