Poimandres 1-3

1 Um dia, em que comecei a refletir acerca dos seres, e meu pensamento deixou-se planar nas alturas enquanto meus sentidos corporais estavam como postos em ligadura1 , como acontece àqueles que abate um sono pesado pelo excesso de alimentação ou de uma grande fatiga do corpo, pareceu que se me apresentava2 um ser de um tamanho imenso3 , além de toda medida definível, que me chamou pelo meu nome e me disse: “Que desejas ouvir e ver, e pelo pensamento apreender e conhecer?”

2 E eu lhe disse “Mas tu, quem és tu?”. — “Eu”, disse ele, “eu sou Poimandres, o Noûs4 da Soberania5 absoluta. Eu sei o que queres e estou contigo por toda parte”.

3 E eu, eu disse: “Quero ser instruído sobre os seres, compreender sua natureza, conhecer Deus. Ó, disse eu, como desejo entender!”6 Respondeu-me por sua vez: “Guarda bem no teu intelecto tudo o que desejas aprender e eu te instruirei.”


NOTAS

1 “Os místicos mais sábios inculcam sem cessar sua ligadura ou suspensão dos poderes”, Bossuet, Etats d’oraison. É a condição necessária para o verdadeiro conhecimento de Deus.
2 Sobre este tema tão frequente de uma revelação recebida no curso de uma visão existe abundante literatura.
3 Lugar comum na “drasis”.
4 Neste caso nome próprio, frequentemente assimilado ao Monogenes, ao Pai e ao Filho. Ele é o único a compreender o Bythos, e é ele que comunica o conhecimento do Pai (Valentino).
5 Termo usado pelos gnósticos, a “authentia” é traduzida pelos heresiólogos como “Summa Potestas”.
6 “pos” exclamativo; a oniciência como meta da gnose.

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