Qual é o espírito do mundo e qual o vínculo das virtudes ocultas

(Riffard1996)

Qual é o espírito do mundo e qual o vínculo das virtudes ocultas

Demócrito, Orfeu e vários pitagóricos que procuravam, com grande cuidado, as virtudes dos corpos celestes e inferiores, disseram que tudo estava cheio de deuses, e não sem motivo, já que não há nada que, por maiores virtudes que possua, sem ser socorrrido pelo poder divino, se possa contentar com a sua natureza; eles chamavam deuses às virtudes divinas derramadas sobre as coisas, virtudes que Zoroastres chamava atractivos divinos e Sinésio atracções simbólicas. Outros chamam-lhes vidas, outros almas, das quais diziam que dependem as virtudes das coisas. Projectando-se uma matéria por uma única alma, sobre as outras em que opera é como o homem que projecta o seu entendimento sobre as coisas inteligíveis e a sua imaginação sobre as coisas que se imaginam. Era isto o que queriam dizer, quando afirmavam, por exemplo, que a alma que saía de um corpo entrava noutro, que o fascinava e impedia as suas operações como o diamante impede o íman de atrair o ferro.

Assim, sendo a alma o primeiro móbil que, como se disse, obra e se move por sua vontade e por si mesma e (sendo) o corpo ou a matéria inábil ou insuficiente para se mover por si, desarreigando-se muito da alma e muito afastada da faculdade desta, é necessário um mediador mais excelso, que não é como o corpo, mas como se fosse já uma alma, ou como se não fosse uma alma, mas sim como um corpo pelo qual a alma se une ao corpo. 0 espírito do mundo é isto para eles, e também se chama quinta essência, porque não provém do quarto elemento, [200] mas é um quinto que está sobre eles e que subsiste sem eles. Um tal espírito é pois absolutamente necessário como meio através do qual as almas celestes se encontram num corpo grosseiro e lhe comunicam as suas maravilhosas qualidades, e este espírito nos corpos do mundo como no nosso corpo humano, pois da mesma maneira que as nossas almas comunicam, por meio do espírito, as suas forças aos nossos membros, assim a virtude da alma do mundo se estende sobre todas as coisas pela quinta essência, pois não há nada no universo que não se deixe penetrar pelo esplendor da sua virtude ou a que falte, as suas forças. Mas influi ainda mais particularmente sobre aqueles corpos que mais tenham tomado desta virtude e deixa-se influir pelos raios das estrelas, à medida que as coisas se tornam conformes. É com este espírito que as qualidades ocultas se estendem sobre as ervas, as pedras, os metais e os animais, por mediação do Sol, da Lua e das estrelas que estão por cima dos planetas; e este espírito ser-nos-á tanto mais útil quanto melhor o soubermos separar dos outros elementos ou melhor empregarmos as coisas em que se encontram mais abundantemente, pois as coisas, sobre as quais este espírito se derrama ao mínimo e onde a matéria está menos retida, aperfeiçoam-no muito mais e produzem mais rapidamente a seu semelhante, pois contém toda a virtude de produzir e engendrar. Esta é a razão por que os alquimistas tentam tirar ou separar este espírito do ouro e, quando podem extraí-lo ou separá-lo, e aplicá-lo imediatamente a toda a classe de matérias da mesma espécie, ou seja metais, fazem-no de imediato com o ouro e prata. Sabemos fazê-lo, vimo-lo praticar algumas vezes, mas não conseguimos fazer ouro a não ser sobre o peso de ouro a que tínhamos extraído o espírito porque, sendo este espírito de uma forma extensa e não contraída, não pode, contra a sua proporção e medida, fazer perfeito um corpo imperfeito, coisa que não nego se possa fazer com qualquer outro artifício.

 

Páginas em