Riffard Teosofia Naturphilosophie

Pierre Riffard — A TEOSOFIA E A NATURPHILOSOPHIE
Excertos de O ESOTERISMO, trad. de Yara Azeredo Marino

O século XVIII é, segundo consta, o século das luzes. Ele começa antes, por volta de 1685. A revogação do edito de Nantes, que pôs fim à condição legal do protestantismo, levou os huguenotes e outros a criticar a tirania do Estado ou da Igreja. Newton descobre a gravitação universal (1687), a ciência moderna torna-se onipotente, repleta de leis e cálculos. O Parlamento inglês confirma a liberdade dos indivíduos e não menciona mais o direito divino (1689).

É comum proceder à oposição de dois séculos XVIII, paralelos: o dos teósofos e o dos ‘filósofos’. De um lado temos os iluministas, os francomaçons, Swedenborg; estes admitem os anjos, visam apenas a reintegração, afirmam as hierarquias iniciáticas e recorrem à teurgia — é o século XVIII dos convulsionários, do magnetismo animal. De outro, encontramos os enciclopedistas, os revolucionários, os fisiocratas; estes acreditam no progresso humano, não acreditam em superstições, elogiam o livre uso da razão, preferem as análises factuais aos princípios metafísicos, afirmam a soberania do povo e aspiram à felicidade — é o século XVIII das diligências, do pintor Watteau, da redistribuição das possessões coloniais. Esse esquema, todo cientista, é uma caricatura. Newton é sábio e hermetista: pratica a física matemática assim como a alquimia tradicional. Ele escreveu o seguinte em seu tratado de ótica: “A transformação dos Corpos em Luz e da Luz em Corpos segue inteiramente as Leis da Natureza, pois a Natureza parece enlevada com as transmutações” (Nature seems delighted with transmutation, in Opticks, 1704, p. 374). Swedenborg foi sábio e depois esoterista. Ele escreveu sobre a astronomia, a álgebra, o cálculo integral e diferencial. Projetou tecnicamente os submarinos, as máquinas a vapor, os pêndulos hidráulicos etc., e mesmo no seu período teosófico permaneceu fiel à ciência e à razão: “Não hesito em proclamá-lo: sou racionalista, já o era aos 11 anos e permanecerei assim por toda a minha existência. Somente meu racional é essencialmente espiritual (…). Confio no método experimental. Comecei a aplicá-lo aos mistérios da natureza antes de aplicá-lo aos mistérios dos céus” (citado in J. Prieur, Swedenborg, Ed. Lanore, 1983, p. 148-149).

O século XVIII é um período que elabora. A Francomaçonaria aperfeiçoa um sistema complexo de altos graus. A Rosacruz se organiza em sociedades hierarquizadas. A teosofia alemã procede à sistematização.

A. Faivre afirma-o: “A filosofia da natureza no romantismo alemão constitui um capítulo importante da história do esoterismo ocidental, pois os filósofos da natureza são todos mais ou menos teósofos. (…) Para os Naturphilosophen, um sopro percorre o universo, o Espírito habita a matéria. Aprofundar-se em si permite encontrar nossas ligações originais com o cosmo, pois contemos em nós o universo inteiro. O interior é como o exterior. Estudar o que nos cerca é também nos conhecermos e conhecer a Deus (…). A matéria se encontra reabilitada no momento em que Deus se manifesta não ‘através’, mas ‘nas’ criaturas. (…) Há um teoandrismo comum à maior parte dentre eles, isto é, a afirmação de uma conjunção das naturezas divina e humana”.

Assim prossegue o iluminismo do século XVII, com seu lado teosófico e sua Naturphilosophie. Uma mesma divisão é encontrada em outros planos: alguns autores são católicos (Von Baader, Maistre, Pernety, Willermoz), outros protestantes (Oetinger, Dutoit-Membrini, Oberlin, Zinzendorf). Muitos são franco-maçons (Von Haugwitz, Maistre, Salzmann, Werner, Willermoz). Entre esses ‘alemães’, como se vê, figuram os franceses, pois a Naturphilosophie e a teosofia também existem na França e na Suíça, com Divonne, Saint-Georges de Marsais, Joseph de Maistre etc.



Pierre Riffard