Amando-se, Adão e Eva amavam Deus; não podiam nem amar, nem conhecer fora de Deus e por eles mesmos, sendo conhecidos como fenômenos separados e não como teofanias. Esse novo gênero de amor foi a concupiscência e esse novo gênero de conhecimento foi a profanidade. Daí em diante, o homem olhava, por um lado, as coisas na sua fenomenalidade isolada e bruta, e, por outro, tornara-se insaciável, homo faber, construtor e produtor. Todavia, trabalhava ainda sob inspiração divina — não há invenções primordiais —, pois se reconciliara com Deus e a invenção propriamente dita estava reservada a fases posteriores à queda. Aliás, o perigo de produtividade prometéica ou titânica explica a proibição de imagens entre os semitas monoteístas, de origem nômade, que tendem a manter o homem numa espécie de improdutividade próxima à simplicidade primordial. Os símbolos bíblicos do “pecado criador” são a torre de Babel e o bezerro de ouro.
”E eles viram que estavam nus”: sua inteligência, sua vontade, assim como sua maneira de sentir tinham se exteriorizado. E por esse motivo, seu amor tinha se afastado da essência divina das coisas, transmudando-se em concupiscência. Os reflexos do divino Sol na água da Existência foram tomados pelo Sol, esquecendo-se de que não passavam de reflexos e envergonhando-se das consequências humilhantes desse erro. Se no simbolismo bíblico e corânico as partes sexuais evocam vergonha e humilhação, é porque lembram ao homem a paixão cega e deífuga, indigna do homem por arrebatar sua inteligência e sua vontade. Mas, evidentemente, essa perspectiva moral não resume toda a verdade, e o simbolismo positivo da nuditas sacra é muito mais profundo. Ele evoca, por um lado, a semidivindade do homem primordial e, por outro, quer nos reconduzir da acidentalidade, diversa e exterior, para a substancialidade, simples e interior. Não obstante, a Bíblia não censura a nudez de Adão e Eva; constata que se aperceberam disso com vergonha, fato relacionado com a queda, mas não com a nudez em si.