Schuon (EPV) – Véus Divinos e Humanos

Os véus sao divinos ou humanos, sem falar dos velamentos que as outras criaturas representam ou experimentam. Em nosso cosmo, os véus divinos são as categorias existenciais: o espaço, o tempo, a forma, o número, a matéria; em seguida, as criaturas com suas faculdades e, também, num plano bem diferente, as revelações com suas verdades e seus limites. Os véus humanos são, primeiro, o próprio homem, o ego em si; em seguida, o ego passional e tenebroso e, finalmente, as paixões, os vícios, os pecados, sem esquecer em um plano normal e neutro os conceitos e pensamentos na qualidade de vestimentas da verdade.

Uma das funções do Véu é separar; o Corão faz alusão a isso de diversos pontos de vista, seja porque a cortina separa o homem da verdade que ele recusa, seja porque o separa de Deus, que lhe fala, ou ainda porque separa os homens das mulheres às quais não têm direito ou, finalmente, porque separa dos eleitos os condenados às penas do inferno. Mas a separação mais fundamental, aquela em que se pensa em primeiro lugar, está entre o Criador e a criação, ou entre o Princípio e a sua manifestação. Na metafísica rigorosa ou total acrescentar-se-á aquela entre o Superser e o Ser, este último pertencente à Maya, consequentemente, à Relatividade; portanto, a linha de demarcação das duas ordens de realidade ou, especificamente, o Véu situa-se no próprio interior da ordem divina.

Se entendemos por Maya a sua manifestação cósmica global, poderemos dizer que Atma se reflete em Maya e, aí, assume uma função central e profética, Buddhi, e que Maya, por sua vez, se encontra prefigurada em Atma e antecipa ou prepara a projeção criadora. Na mesma ordem de ideias: é Maya contida em Atma — é, portanto, o Ishwara criador — que produz o Samsara ou o macrocosmo, a hierarquia dos mundos e o encadeamento dos ciclos. E é Atma contido em Maya — no Mantra sacramental — que desfaz o Samsara na qualidade de microcosmo. Mistério de prefiguração e mistério de reintegração: o primeiro é o da Criação e também o da Revelação; o segundo é o do Apocatástase e também o da Salvação.

Tudo isto evoca o simbolismo taoísta de Yin-Yang: uma região branca e uma região negra na primeira e um disco branco na segunda, indicando que a relação entre a Face e o Véu se repete dos dois lados do Véu, primeiro no interior, in divinis e, em seguida, no exterior, no seio do universo. Nos termos sânscritos existem Atma e Maya, mas por isso mesmo há também — já que a Realidade é una e a natureza das coisas não pode implicar um dualismo inato — Maya em Atma e Atma em Maya.

Frithjof Schuon